“Ziraldo era o tipo de pessoa simples que sentava no chão com as crianças”.
A forma como a educadora e especialista em Literatura Infantil, Domingas Colombo Giacomin, 70, recorda do escritor e cartunista que morreu neste sábado (6) ilustra o quanto Ziraldo era acessível ao público. A convite de Domingas, o criador do Menino Maluquinho esteve em Caxias do Sul em quatro oportunidades entre os anos de 1988 e 2008. O escritor foi sepultado domingo (7), no Rio de Janeiro.
O escritor vinha a Caxias do Sul para encontrar os leitores mirins, que, já preparados, apresentavam peças teatrais inspiradas em suas obras. Foi por conta do projeto “Encontro do Escritor com o Aluno” que Ziraldo esteve pela primeira vez, em agosto de 1988, no Colégio La Salle Carmo. Na época, Domingas era a bibliotecária e incentivou que as crianças estudassem os livros do autor para que a visita fosse ainda mais prestigiada:
— Eu tinha muito apoio das livrarias e das editoras para trazer os autores. Eles conversavam entre si e gostavam de vir para cá porque viam que os alunos sabiam com quem estavam falando. E o Ziraldo foi um deles que, inclusive, me indicou para ter o projeto registrado na Biblioteca Nacional — conta.
A receptividade dos alunos com Ziraldo foi tanta que o escritor retornou outras três vezes, sempre nas escolas em que Domingas trabalhou. Naquele 11 de agosto, na dedicatória de um livro, escreveu:
“Para a querida Domingas, que me deu um dos melhores 11 de agosto de minha vida. E olha que 11 de agosto sempre foi um dia de felicidade para mim. Um beijo do Ziraldo.”
Oito anos depois, em 1996, o autor batizado por meio de uma combinação dos nomes dos pais, Zizinha e Geraldo, visitou o extinto Colégio Leonardo da Vinci. Em 2001 esteve no também extinto Colégio Dante Alighieri e mais tarde, em 2008, no Mutirão Objetivo.
Com 44 anos dedicados à literatura, Domingas foi bibliotecária por onde passou. Já aposentada, a educadora mantinha contato com Ziraldo por meio das cuidadoras que o acompanhavam desde 2018, quando sofreu um AVC. Em 2022, quando o autor completou 90 anos, uma homenagem escrita por Domingas lembrou da importância do cartunista para a literatura infanto-juvenil:
— Uma figura carismática que conquistou diversas gerações. Como ele mesmo diz, a escola deve ensinar a criança a continuar criança, mesmo depois de crescer. Só um escritor maluco como Ziraldo seria capaz de criar e manter todos estes anos o Menino Maluquinho.
Junto da turma do Pererê e do bichinho da maçã, o Menino Maluquinho, personagem mais famoso de Ziraldo, é para quem admira a obra de Ziraldo, um "trampolim da fantasia". O termo foi escolhido por Domingas quando parabenizou o amigo em 2022:
— Nosso Menino Maluquinho assume os cabelos brancos e procura nos apontar caminhos para a construção de um mundo melhor. É um trampolim do imaginário infantil, que não se perde nunca, nem quando se envelhece, pois quem tem fantasia tem felicidade.
Acadêmica da Academia Caxiense de Letras, Domingas concorda com uma frase dita por Ziraldo e lembrada por ela em sua homenagem: “Ler é melhor que estudar”.
— Essa máxima é o retrato deste meu amigo querido. Embora muitos fizeram uma leitura equivocada desta frase, Ziraldo quis justamente enfatizar a importância de se vivenciar o mundo diversificado que é a Literatura. Lido em todo o mundo. É uma perda lamentável — diz.
O presidente do Instituto de Leitura Quindim, Volnei Canônica, lembra que a primeira relação dele com Ziralado é como leitor:
_ A obra dele é fundamental. Flicts muda o conceito de livro infantil e juvenil não só no Brasil, como no mundo.
Em 2008, quando foi morar no Rio de Janeiro teve a oportunidade de estar muito próximo dele por conta da atuação junto a Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil. Foi responsável, enquanto curador do Ler _ Salão Carioca do Livro ao lado de Verônica Lessa, por fazer uma das últimas homenagens para o Ziraldo e 2019, com a presença dele.
Roger Mello, vice-presidente do Instituto e marido de Volnei, começou a trabalhar com Ziraldo aos 22 anos e se tornou da família, o que permitiu a Canônica, anos depois, estreitar os laços familiares com o escritor. Na percepção de do presidente do Instituto, Ziraldo era alegre, dócil, bem humorado e ácido:
– Era um defensor da democracia, das crianças e infâncias. Ele cria personagens fundamentais que trazem a brasilidade para as histórias em quadrinhos e nosso folclore. O Ziraldo é um grande amigo e uma grande perda emocional, literária, mas a obra dele não finda e a gente vai continuar valorizando, fazendo com que ela chegue para mais pessoas.