Um filme doce e singelo. Um filme envolvente. Um passeio por entre vias de encontros que resultam em desencontros. Esse é o resumo simbólico – e sutil – de Vidas passadas, estreia da dramaturga (e, agora, também cineasta) sul-coreana, Celine Song. A obra está bem cotada para duas das mais importantes categorias do Oscar 2024: Melhor Roteiro Original e Melhor Filme Estrangeiro. A premiação ocorre neste domingo (10). Corre que dá tempo de assistir a Vidas passadas a partir de quinta-feira (7), às 19h30min, na Sala de Cinema Ulysses Geremia (Centro de Cultura Ordovás), em Caxias do Sul.
Antes de voltar ao conteúdo simbólico, um pincelada no enredo. Dois amigos de infância, Na Young e Hae Sung, que estudavam juntos, na mesma sala de aula e percorriam o mesmo trajeto de casa à escola, acabam por se separar quando a família de Na Young decide migrar da Coreia do Sul para o Canadá. Quando questionada pelas colegas sobre o porquê de ir embora, ela diz: “Ninguém ganha um Prêmio Nobel de Literatura morando na Coreia”. No caminho para casa, Na Young e Hae Sung separam-se na primeira bifurcação de suas vidas.
Na Coreia, Hae Sung trilha o caminho da engenharia, mora com os pais, frequenta o mesmo bar com os amigos e planeja aprender mandarim em um intercâmbio na China. “Vai ser bom para a minha carreira”, diz ele, aos amigos. No outro lado do mundo, Na Young migra do Canadá para os Estados Unidos, passa a ser chamada de Nora e vive em um minúsculo apartamento em Nova York. Por lá, tomou o rumo da literatura e do teatro, em sintonia com a atividade de cineasta do pai. Por conta da divulgação de um novo filme do pai, pelas redes sociais, Nora acaba retomando contato com Hae Sung, seu amigo de infância.
No final do dia, uma história é uma história. O que interessa é a personagem, o diálogo, a história. Isso é o mais importante.
Celine, 36 anos, a diretora e também autora do roteiro, é uma artista que, assim como a protagonista, saiu da Coreia. Nos últimos 10 anos tem vivido em Nova York, onde se consolidou no teatro. Das lições que traz das cenas à luz de um palco para os imensos telões do cinema, ela disse, em uma entrevista para o jornal português Observador: “No final do dia, uma história é uma história. O que interessa é a personagem, o diálogo, a história. Isso é o mais importante”.
Vida e obra se confundem e se misturam por meio da trama de Vidas passadas, reconhece Celine. Quer ver? Celine e Na Young (mais tarde Nora), são adolescentes que migraram, são também escritoras, tiveram de se adaptar a uma nova cultura e ambas conheceram os maridos em uma residência artística. Assim como Nora (ou a eterna Na Young para Hae Sung), Celine também esteve em um bar, sentada no balcão, entre o marido (norte-americano) e o namorado de infância. Em meio à tentativa de traduzir as falas do marido e do ex-namorado, Celine disse: “Na verdade, estava traduzindo duas partes de mim mesma”.
Ciclos de 12 anos
Depois daquele adeus, na primeira bifurcação de suas vidas, se passaram 24 anos até que eles retomassem contato, presencial. Voltando à simbologia... Na astrologia, Júpiter passa um ano em cada signo. Sendo assim, leva 12 anos para viajar ao redor do zodíaco. Se pensarmos no ciclo dos personagens (incluindo Celine), as viradas na vida se deram aos 12, aos 24 e, agora, aos 36 anos. Na astrologia (e quem sabe, no filme de Celine), Júpiter (o gigante do sistema solar, maior de todos os planetas) rege o sentido que damos à vida e às experiências, por mais desafiadoras que sejam. Pode ser visto como um arquétipo benevolente e generoso, relacionado ao otimismo, amor pela liberdade, expansividade e por novas experiências.
“Na verdade, estava traduzindo duas partes de mim mesma”.
Júpiter não transita pelo mesmo lugar na vida de todos, vai depender da conjuntura astral de cada um. Contudo, ciclos de encontros e desencontros, de amor e desamor, de encantos e desencantos, estão na rota de todo ser vivente. Encontrar sentido nessa aparente disritmia entre a expectativa e a realidade, entre o que é ou não possível de se encarar hoje e agora, parece ser um alento. Ou até mesmo sobrevida para atravessar continentes atrás do amor de tantas vidas ou, então, resignar-se, sentado atrás de um computador, a fim de reescrever histórias, antes doloridas, agora ressignificadas pela melancolia de um amor interrompido.
Programe-se
- O quê: Vidas passadas (2023), de Celine Song, com Greta Lee, Yoo Teo, John Magaro.
- Quando: de quinta-feira (7) a domingo (10), às 19h30min. Em cartaz até o dia 17.
- Onde: Sala de Cinema Ulysses Geremia (Centro de Cultura Ordovás)
- Quanto: ingressos a R$ 20 e R$10 (meia-entrada). Nas quintas-feiras, até o final deste mês, ingresso promocional a R$ 10.