Dinheiro para comprar lanches, brinquedos ou economizar para adquirir um videogame, pago com recursos próprios. Gerir finanças não é só conversa de adulto. Pode, e deve ser, assunto também para abordar com a gurizada. Ainda que os objetivos das crianças sejam bem mais simples que o planejamento financeiro dos adultos, aprender a usar dinheiro, durante a infância, pode ser um importante instrumento para uma iniciação à educação financeira.
No processo de ensinar o custo dos mais variados produtos, além de brinquedos e games, os pais se dividem no que consideram ser a melhor forma de estimular a independência financeira dos filhos.
Conduzida pela Serasa, a pesquisa Finanças para os Filhos: Dinheiro é Coisa de Adulto?, revelou que, no Brasil, 39% dos pais ainda adotam a prática de conceder mesada. Ou seja, um valor mensal repassado à gurizada com base em algumas regras definidas pelos pais ou responsáveis. Segundo os entrevistados, além de dar autonomia para comprar lanches na escola, por exemplo, a principal finalidade é ensinar a criança a poupar para o futuro.
A maioria dos entrevistados (61%) diz que prefere não conceder a mesada. Eles entendem que é preciso ensinar a importância do trabalho como forma de ganhar dinheiro. A psicóloga e orientadora educacional, Fernanda Henz, diz que os pais precisam definir juntos de que forma a criança deve lidar com a mesada.
— Acredito que seja saudável, a partir de um combinado, que a criança entenda que não ganha por ganhar. É preciso haver uma responsabilização, combinar tarefas é um exemplo. Outro exercício pode ser incentivá-los a levar seu dinheiro nos passeios, para que elas gastem com aquilo que os pais não pretendem dar. Dessa forma elas vão entender o quanto demorou para conquistar e no que vão escolher gastar. Vão entender assim que toda escolha estará ligada a uma perda — explica Fernanda.
A psicóloga considera adequado iniciar esse estímulo a partir da alfabetização, quando as crianças têm de seis a sete anos. Entre os benefícios, diz ela, está a conscientização financeira e o risco menor de endividamento na vida adulta.
A coordenadora pedagógica, Poliana Molon, concorda que dar liberdade aos pequenos para que gerenciem os próprios desejos faz parte das etapas de um crescimento saudável e, o caminho para isso, pode ser a inclusão das crianças nas decisões que compõem o planejamento familiar:
— É preciso transmitir esse entendimento. As crianças sabem se o pai perdeu o emprego ou se foi promovido e acho que as famílias precisam começar, de alguma forma, o processo de ensinar sobre dinheiro a partir de um diálogo franco e que faça a criança se sentir pertencente — pontua.
Ensinando a poupar
Cartões por aproximação e pagamentos pelo celular e por PIX são opções de compra que têm mudado os hábitos de consumo da população. No entanto, o dinheiro impresso ainda é o mais utilizado pela gurizada. De acordo com a pesquisa da Serasa, 63% das crianças que ganham mesada recebem por cédulas de papel ou moedas. É o caso de Felipe Sironi, 10, que guardada dentro da carteira uma "pequena fortuna" para a sua idade.
O estudante do 6º ano do Ensino Fundamental faz parte da turma que acumula recursos a cada aniversário ou Natal. Em vez de presentes ele ganha dinheiro dos avós e padrinhos. As finanças são geridas com a ajuda da mãe, Elaine Sironi, que acompanha atenta os desejos de compra de Felipe e seu irmão Miguel, 12.
— A partir dos nove anos nossa família não dá mais presentes, optamos por presentear com dinheiro para que eles gastem como quiserem. Então, coisas que consideramos supérfluas não damos mais e convidamos para que gastem do dinheiro deles — conta Elaine.
De acordo com a mãe, se os meninos precisam pagar pelo que não está no orçamento familiar, eles acabam pensando duas vezes antes de tirar o dinheiro da carteira.
— Entendemos que as tarefas diárias são intrínsecas da convivência e que cada um tem que fazer a sua parte dentro de casa, por isso, não damos mesada e, sim, fizemos alguns exercícios financeiros. No ano passado, por exemplo, não demos o álbum de figurinhas da Copa do Mundo, porque julgamos que seria um gasto alto e desnecessário, então provocamos que completassem com o dinheiro deles e acabaram optando por fazer em conjunto para gastar menos — recorda Elaine.
Compartilhar os desejos de compra como foi feito pelos irmãos é, para a pedagoga Poliana Molon, resultado de uma cultura de cuidado com o dinheiro. Por trás disso, ainda está a consciência de reaproveitamento de materiais escolares e o fato de não trocar de mochila a cada ano, por exemplo, pelo simples motivo de não ser um item de primeira necessidade.
— Uma vez provocados a gastarem o que ganharam, as crianças podem criar uma consciência de controle do consumismo. Tem algo de sustentabilidade nisso, de uma conscientização ambiental muito presente nas crianças de hoje, de que não precisam a todo momento de algo novo — justifica.
R$80 por mês e dinheiro emprestado pelo filho
Quem opta pela mesada justifica a prática como exercício de responsabilidade, consciência e planejamento. Essa é a opinião dos especialistas. Por isso, quando o filho completou sete anos é que a analista de recursos humanos, Angélica Casiraghi, iniciou os repasses mensais de R$ 40.
Atualmente, satisfeita com o controle do dinheiro nas mãos do filho Felipe, 10, ela reajustou os valores e dá a ele uma mesada de R$ 80. No entanto, segundo ela, há meses que orçamento aperta e o valor, pago sempre no quinto dia útil do mês, pula para o mês seguinte.
— Já teve meses que não consegui dar e, inclusive, já peguei emprestado com ele, porque precisava de dinheiro em notas de papel e só ele tinha — conta Angélica.
As transações, segundo ela, são todas anotadas e lembradas pelo guri, que somou as quantias ganhas de familiares com a venda de uma bicicleta e, por conta disso, um ano depois Felipe comprou um videogame.
— Não é só dar o dinheiro para que ele decida o destino. É uma mesada educativa, no começo era um valor simbólico que ele gastava muito rápido em compras sem necessidade. Conforme criou a consciência de economia ele entendeu que se guardasse teria um poder de compra maior.
Dicas para ensinar as crianças a cuidar do dinheiro
Para a psicóloga e orientadora educacional, Fernanda Henz não há um período da infância específico para que se iniciem as conversas sobre dinheiro. Ela diz que a economia está no dia a dia e gerir o que ganhamos deve fazer parte do diálogo em família. Um bom momento para iniciar atividades que darão noções de educação financeira às crianças é junto da alfabetização, a partir dos seis anos. Leia a seguir algumas dicas que podem ajudar nessa conscientização do uso do dinheiro.
:: Não esconda a situação financeira familiar::
:: Ensine de onde o dinheiro vem::
:: Ensine o que é necessário e o que é supérfluo::
:: Registre os gastos e estimule a criança a fazer o mesmo::
:: Dê autonomia, mas fique alerta com o que a criança deseja gastar::