É inegável. Desde que Jair Messias Bolsonaro (PSL) apareceu como candidato à presidente, ressurgiu um coro que parecia adormecido desde o período da Ditadura Militar. A ala conservadora entrou em cena, também em Caxias, impulsionada pelas redes sociais em um clima de indignação política, por conta das inúmeras denúncias e comprovações de atos ilícitos e corrupção em várias instâncias do poder.
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A reportagem do Almanaque deste final de semana ouviu caxienses identificados com a visão de mundo conservadora, como a educadora física e fisioterapeuta Nadja Rippel e o médico Arielson Milani. Eleitores de Bolsonaro entendem que a sociedade brasileira está desajustada, economicamente, moralmente e ideologicamente, e só um governo linha dura, baseado na tríade Deus, pátria e família, poderá recolocar o Brasil nos eixos. Alguns poderão classificá-los como reacionários ou retrógrados, por insistirem em ideais, princípios e valores do passado. Mas eles defendem o bolsonarismo como o movimento que tirou a mordaça das suas bocas e, enfim, dialogou com os anseios dessa maioria.
— Estávamos cansados da demagogia toda. Aquele nicho político de minorias não nos representava. Por exemplo, vinha alguém discursar: "Eu estou aqui para representar a minoria negra e homossexual". Tá ok, mas e a maioria? As leis todas em prol das minorias e tu sendo cada vez mais delapidado. Essa síndrome de patinho feio, que tem as minorias, é alimentada pelo progressismo — desabafa Nadja, 42 anos.
O que é de fato conservadorismo?
Conservadorismo no Brasil tem se estabelecido como sinônimo de pessoas com uma posição ajustada e alinhada a expoentes como o presidente Bolsonaro, a ministra Damares Alves e o deputado Marco Feliciano (PSC), ou, no âmbito municipal, com o pensamento do prefeito Daniel Guerra (PRB) e do vereador Renato Nunes (PR).
No entanto, como observa o doutor em filosofia Luiz Felipe Pondé, o cerne da questão é que o conservador, na tradição britânica, é cético e quer o Estado longe da sua vida.
— O conservador, no sentido filosófico, e baseado nos estudos do filósofo britânico Michael Oakeshott, é cético com a política. Enquanto que os progressistas, são pessoas que entendem a política como um ato de fé, por causa do caráter utópico.
Pondé, analisa a origem da palavra "conservadorismo".
— O termo surge, primeiramente, para se referir às pessoas que se diziam contra a Revolução Francesa e queriam a volta da Monarquia. Mas o "pensamento conservador", no sentido filosófico, nasce na Inglaterra e tem origem em um ceticismo pela política. O conservador, em geral, entende que só pode mudar as coisas a partir de situações concretas e não a partir de uma visão de mundo, como acreditam os progressistas — define Pondé.
Menos Estado, por favor
Fazem parte desse grupo de pessoas céticas politicamente e que desejam um Estado que interfira menos em suas vidas, o microempreendedor, produtor cultural e realizador cinematográfico, Leandro Daros e a família do professor Cássio Rodrigo Galloni Vieira.
— Nem tanto à esquerda, nem tanto à direita. É o caminho do centro que sempre acaba funcionando melhor — justifica Leandro.
A esposa de Cássio, pondera que só quer lutar pela lei que beneficiará seus filhos com o direito à educação domiciliar.
— Para nós, o modelo educacional tradicional não funciona. Não temos nada contra os professores, acredito que eles fazem milagre com os poucos recursos, só queremos o direito de dar aula em casa para os nossos filhos — defende a contabilista Melissa Halewicz Galloni Vieira, 37 anos, que deixou de trabalhar para dedicar-se à educação dos filhos, Miguel, nove anos e Alice, nove meses.
O direito à educação domiciliar
O casal Cássio e Melissa Galloni Vieira é um dos retratos mais evidentes do ceticismo político. Para eles, pouco importa o discurso ideológico, aliás, quanto mais retórica, menos interesse demostram. Sua decisão política na última eleição presidencial estava muito mais baseada no candidato que mais versava com seus interesses pessoais, do que em uma visão de mundo.
— Meu candidato nem pontuou na eleição, mas, sim, o Bolsonaro era uma chance de mudar — observa Melissa, que prefere não confirmar em quem votou no primeiro turno.
Cássio justifica o voto em Bolsonaro por dois aspectos, acentuado pela pauta do direito de educar os filhos em casa.
— Um dos pontos positivos do Bolsonaro era que ele apoiaria a educação domiciliar. Mas, com sinceridade, eu te digo que o voto no Bolsonaro foi mais por estar brabo com o PT, porque eles tinham de ter feito melhor. Mas, claro, a proposta de educação domiciliar me agradava, assim como a de baixar o imposto dos jogos eletrônicos — brinca Cássio, sem perder a sinceridade.
Melissa, no entanto, anda temerosa com a demora da votação do projeto de 3262/2019, feito a partir de uma proposta de 2015, do então deputado Eduardo Bolsonaro.
— A gente não quer interferência do governo, então, no meu entendimento, não deveria ter essa questão política ligada à educação domiciliar. Nós, como a maioria das pessoas, só queremos garantir nosso sustento, cuidar da nossa família, não queremos ideologias — define Melissa.
— Se eu quero educação domiciliar sou da extrema direita? — questiona Cássio.
Arsenal político
Para eles, o que atrapalha é quando políticos se apropriam das pautas de interesse da sociedade e as transformam em arsenal ideológico. O maior problema ainda é a polarização, acredita Cássio.
— Quem é mais de esquerda, tem de dizer que é feio educar os filhos em casa, mas quem é mais de direita, tem de dizer que gosta.
Melissa e Cássio frisam que não se trata de lutar pelo fim da escola, nem questionar o trabalho dos professores.
— Todos os dias quando o Miguel volta da escola eu pergunto: "E daí, filho, o que tu aprendeu hoje?". Ele responde: "Não aprendi nada de novo. Só reforcei o que já sabia". Mas é uma injustiça colocar a culpa nos professores. A escola hoje, trabalha a formação em massa das pessoas. Como um professor vai dar atenção individual para 30 e poucos alunos em aula? Teria de mudar a forma e o sistema educacional. Por isso, acreditamos que o nosso filho pode ter mais resultado em casa do que na escola tradicional — justifica Melissa.
Educação como política de Estado
— Cara, isso não é de agora, nem só dos governos do PT, é de 300 anos. A educação vem decaindo e ninguém faz nada — reclama Cássio.
No Jornal da Cultura, na última terça-feira à noite (dia 13 de agosto), quando perguntado sobre uma possível melhora da educação em médio prazo, o historiador e professor, Leandro Karnal, em poucos segundos resumiu o que pensam Cássio e Melissa:
— Eu acho que nada em educação é de médio prazo. Sigo a frase do grande educador Rubem Alves que diz professor semeia carvalho, não vai ver o resultado. Não semeamos bambu ou soja. Precisamos de uma política de Estado e não de governo e planos educacionais de 50 a 100 anos.