Entre os blocos que integram a programação do carnaval em Caxias do Sul neste ano, um deles se destaca pela proposta diferenciada com relação aos demais. Primeiro cortejo popular dedicado a reafirmar, exclusivamente, a identidade da etnia negra no município, o bloco Afro Navio Negreiro traz como um dos principais pontos a conscientização a respeito da intolerância e preconceito racial. O bloco, que vai às ruas no próximo dia 15, reúne uma série de vertentes ligadas aos movimentos sociais, artísticos e religiosos que simbolizam a cultura afro-brasileira na cidade.
A proposta do grupo é simples: utilizar a festa como uma ferramenta para reforçar os valores africanos, por meio da sonoridade do tambor típico e das danças populares, mas sem deixar de incentivar o diálogo com as outras culturas. Participam dessa união de forças grupos como o Sabar Africa, que há mais de cinco anos representa os imigrantes ganeses, haitianos e senegaleses que chegaram ao município.
– Temos uma ligação muito forte com Caxias e adoramos essa cidade. Fazer essa festa é uma forma de mostrar como nos sentimos em casa – afirma um dos representantes do Sabar Africa, o senegalês Sulemana Adamu.
A principal liderança do bloco, conhecido pelo nome religioso Tonico de Ogum, tem uma longa atuação diante de questões da cultura afro-brasileira. Há mais de oito anos ele trabalha como músico percussionista e desenvolve atividades de educador junto a entidades de assistência social no município. A proposta de trazer um carnaval focado nas manifestações afro-brasileiras, segundo ele, reside na ideia de promover a igualdade.
– Caxias do Sul reúne centenas de casas de umbanda e, por isso, tem uma forte ligação com a cultura negra, mas, por outro lado, tem uma forte influência italiana. Queremos fazer esse diálogo, unir as tonalidades e mostrar essa diversidade – destaca.
O bloco conta com a participação de Vanessa Carraro, idealizadora do Maracatu Caxias, um dos movimentos mais conhecidos no carnaval da cidade. Ela conta que as danças do bloco são oriundas dos chamados afoxés – os cortejos de rua do carnaval ligados às manifestações religiosas e folclóricas mais comuns no Nordeste do país.
– São danças inspiradas nos afoxés a partir da vivência da negritude, trazendo esse estudo de corpo, de significado, quando os gestos se tornam símbolos de expressão, inclusive do feminino – aponta Vanessa.
A denominação escolhida para o bloco, Navio Negreiro, também não é por acaso. Ao remeter à memória dos negros escravizados que vieram ao continente durante o período colonial, não deixa de trazer à tona questões que fazem parte da realidade atual, como a imigração recente que modificou o panorama da população de Caxias do Sul.
– O nome vem desse legado africano, mas queremos que isso vá além desse sentimento de melancolia associado a essa ideia – salienta Tonico de Ogum.
No dia 15, grupo vai iniciar a concentração na Praça Dante Alighieri, a partir das 20h. Depois, o cortejo segue pela Avenida Júlio de Castilhos, passando pela Rua Coronel Flores até chegar na Estação Férrea, local onde ocorre uma mobilização com apresentação de danças populares, capoeira e ritmos de percussão inspirados em referências folclóricas e religiosas. A expectativa é de reunir cerca de 2 mil pessoas.
O bloco está convidando para ensaios interessados em fazer parte das danças que serão apresentadas durante o evento. As aulas ocorrem às quartas-feiras, às 21h, e nas sextas, às 20h, no Studio Camila Oliveira, na Rua Augusto Pestana, nº 810, junto à Estação Férrea. Aos sábados, os ensaios serão realizado no Ponto de Cultura da UAB, na Rua Luiz Antunes, às 13h.