Quando Marco Ricca leu o roteiro de As Duas Irenes pela primeira vez, disse ao diretor Fabio Meira: "você só precisa de um par de botas e de uma voz". Ele se referia ao personagem Tonico, homem que mantém duas famílias secretamente e tem duas filhas com a mesma idade e com o mesmo nome. No entanto, Ricca transcende na telona o que, no roteiro, era tido pelo diretor mais como uma presença do que como um protagonista.
– No roteiro, ele não chegava a ter tanta força, mas o Marco transformou um par de botas num personagem complexo – contou Meira, estreante em longas.
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Atualmente no ar na série Os Dias Eram Assim, Ricca não conseguiu ver o filme em Berlim e conferiu o "seu" Tonico pela primeira vez no telão do Festival de Cinema de Gramado, em exibição na noite de domingo. O ator já desponta como forte candidato ao kikito pela performance que reúne sutilezas na pele do homem interiorano (de botas) e retrógrado.
– Gosto de trabalhar com diretores novos, eles nos recolocam na profissão, percebo quanto cada vez é mais importante confiar na dramaturgia do cineasta. O ritmo da TV nos põe em outro lugar, é uma coisa tão rápida e industrial. Quando li o roteiro desse filme pela primeira vez, fiquei muito tocado –justificou Ricca.
As duas Irenes do título, interpretadas por Priscila Bittencourt e Isabela Torres (foto abaixo), são quem conduzem a história. A primeira integra a família oficial de Tonico e acaba descobrindo que possui uma irmã muito diferente dela, na qual acaba se espelhando. A relação entre elas e como uma modifica a formação da identidade da outra são pontos altos do roteiro. Ainda na "ressaca" da temática trazida por Laís Bodanzky em Como Nossos Pais (apresentado no fim de semana), a ótica feminista em As Duas Irenes também entrou no debate. As adolescentes, personagens centrais do longa, carregam essa responsabilidade.
– A poética do filme está no amadurecimento e na transmutação das meninas. Eu vi esse amadurecimento com uma dramatização raríssima, e essas meninas espetacularmente conduzindo isso – opinou Ricca.
A atriz Priscila foi escolhida entre cerca de 250 meninas em testes. Ela e Isabela (a outra Irene) não leram o roteiro antes das filmagens. No set, o diretor costumava falar com as duas individualmente, explicando detalhes da interpretação. Na coletiva em Gramado, no entanto, Priscila revelou que as duas compartilhavam tudo que o diretor dizia.
– Olha aí o empoderamento feminino – brincou o diretor, ao saber que foi "enganado" pelas gurias.
Nesta terça no festival
A partir das 19h, a mostra de longas latinos traz o argentino Sinfonia para Ana e a mostra brasileira tem A Fera na Selva, de Paulo Betti, Eliane Giardini e Lauro Escorel. Ingressos para o Palácio dos Festivais custam R$ 40.
Confira os trailers dos longas que participam da competição no Festival: