Uma tradição na decoração das cozinhas da região, os panos de parede foram companheiros de gerações de mulheres que escreveram boa parte de suas trajetórias no ambiente doméstico. No Museu Municipal, há mais de 150 peças assim, a maioria bordada com frases que hoje causam estranhamento. E esse foi exatamente o critério para a escolha dos cerca de 15 panos que compõem a mostra Tons e Pontos: A Voz da Mulher nos Panos de Parede, com abertura marcada para esta terça.
– Escolhemos frases que remetem à educação moralizante dessas mulheres – explica a diretora de museus da Secretaria da Cultura, Ludimila Zan.
Entre as mensagens explicitadas nos tecidos estão, por exemplo: "Um bom manjar prende o marido ao lar", "O silêncio vale ouro", "Pela cozinha se conhece a cozinheira", "A almas discretas são como as violetas" ou "Trabalhas em harmonia e viverás com alegria".
– Elas falam de amor, da cozinha, de religião, falam de um universo mais privado dessas mulheres. É como se fossem cartas, onde elas se expressam. Revelam, mas escondem ao mesmo tempo – comenta a secretária de Cultura, Adriana Antunes, uma das convidadas da para falar na abertura da mostra, sobre a Representação do Universo Feminino - Da Colônia a Caxias de Hoje.
As peças datam de décadas entre 1920 e 1960. A maior parte é bordada, mas há também algumas pintadas. As frases são acompanhadas por ilustrações como pássaros e flores, copiados de livros infantis europeus. Alguns dos papéis de seda com esses desenhos – que muitas vezes passavam de geração a geração dentro da mesma família – estarão também expostos no Museu Municipal.
– Eram momentos em que as mulheres podiam se encontrar, faziam troca de recortes. Existia essa troca feminina entre elas, que era também uma forma de elas manterem sua sanidade mental, numa irmandade que se estabelecia. Esse aspecto emocional dos panos é bem importante – aponta Adriana.
O filósofo Gilmar Marcílio também participará da palestra de abertura da exposição, ao lado de Adriana. Para ele, os panos de parede trazem memórias afetivas que carregam um viés mais positivo.
– Convivo muito com essa realidade rural, de tias, mãe e avós que bordavam. Me remete a um apacientamento, uma quietude, a uma tranquilidade existencial que está longe dessa angústia das escolhas atual. A história dá essa ideia de que sempre se ganha e sempre se perde – diz ele.
Marcílio acredita que o encontro, assim como a própria exposição, terão caráter interrogatório no sentido de tentar descobrir um pouco sobre a rotina feminina de tempos atrás.
– Claro que acho que teve muita neurose, dor, frustração, eram vozes abafadas. Mas minha percepção vai mais para o lado de minha vivência, de um cotidiano manso, sem grandes oscilações. Essas mulheres teciam pensamentos, não só fios. No fundo, sabiam secretamente que eram o esteio das famílias – opina o filósofo.
PROGRAME-SE
:: O que: Exposição Tons e Pontos: A Voz da Mulher nos Panos de Parede
:: Quando: abertura nesta terça, às 19h. Visitação até 15 de abril, de terça a sábado, das 9h às 17h
:: Onde: Museu Municipal (Visconde de Pelotas, 586)
:: Quanto: entrada franca
:: Informações e agendamento de visitas guiadas: (54) 3221.2423