Advirto que nesta estória qualquer semelhança é mera coincidência: Eram uma vez dois garotinhos, amiguinhos e arteiros, cujos sentimentos de amor e ódio oscilavam antípodas, de um polo a outro, diametralmente opostos. Dois precoces extremos e futuros extremistas. Amavam-se e odiavam-se. Juntos brincavam com fogo. Sempre, querendo superar o outro. Ao se desentenderem, nas travessuras infantis, estragavam suas mochilas, riscando cadernos e rasgando livros. Nas escolinhas maternais só cobiçavam levar vantagens. Nenhum queria ficar em segundo. Vice nem pensar. Não foi diferente nos colégios. Sabidinhos e sabichões, determinados e movidos por toques obsessivos-compulsivos achavam que apenas as suas opiniões é que valiam. Oito ou oitenta.
Ao servirem o Exército por pouco não se mataram nos treinamentos militares, apontando-se fuzis e baionetas e mesmo buchas de canhão. Nas recreações festejavam a "amizade" e brindavam a "inimizade". As farras se acentuando nos estudos universitários. E as convergências e divergências alcançaram a estratosfera. De tanta volúpia pretendiam lecionar para os próprios professores e, se possível fosse, concorrer para Reitor. Jamais para "vice". Disputavam as namoradas entre tapas e beijos. Beijos delas e tapas deles, pois dois bicudos não se beijam. Ainda assim, eram amistosos e belicosos.
Com a idade adulta julgou-se que eles haviam amadurecidos para se aturar na santa paz, coexistindo pacificamente. Daí, se coligarem em arrojados e desafiadores projetos, jantando com o inimigo. Graças aos seus créditos arrecadaram fundos (ou seriam votos?...) para montar uma grande e inigualável empresa (ou seria uma prefeitura?...). Por cima da carne seca e da carne fraca apostaram todas as fichas. Arrumaram muitos fiadores (ou seriam eleitores?...). Tudo parecia às mil maravilhas. Até que o conto de fadas se enfadou. Inimigos, inimigos, negócios à parte. Oh, vaidade das vaidades!
Pior: ninguém sabe desvendar qual será o epílogo dessa intrigante novela - haverá final feliz? Quando um resolveu pedir as contas e se mandou, o grupo acionário (seria o povo?) acreditou que era fim de linha, com diálogos impossíveis. A política não era a sua praia, quer dizer, a empresa. Fez que foi, mas não foi, antes que o arrependimento matasse. A volta dos que não foram. Surpresa: o pombo fugido do ninho regressou saudoso. O pombal tornou a arrulhar, aparentemente feliz e bagunçado como o diabo gosta. Afinal, com amigos assim para que inimigos?