Não tenho medo de avião. Nunca tive. Acho bacana quando aquela coisa descomunal sai do chão empurrado por motores. Uma façanha da humanidade, uma vitória da ciência. Toda decolagem deveria ter a Cavalgada das Valquírias do Richard Wagner como trilha sonora. Não tenho medo. Porém, não posso dizer o mesmo de aeroportos. Tudo me assusta em aeroportos. O medo de perder o avião, de errar o portão, de me perder e ficar para todo sempre preso naquele labirinto de gates e esteiras. Isso sem falar nas áreas de checagem. Seguranças, raio-X e scanner. Me pelo de medo! Aí que essa gente, vendo o meu medo, se prevalece!
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As áreas de segurança dos aeroportos americanos então, nem se fala. Depois de atentados, todo cuidado é pouco. Mesmo assim, com toda a extrema precaução ainda acontecem porcarias. O preço da liberdade é a vigilância eterna, já dizia Thomas Jefferson. Mas que assusta, assusta. E eles sabem apavorar um viajante já apavorado.
Sempre tento fazer o mais certo possível. Levo todos os documentos impressos. Passaporte válido, relatório ESTA quando uso o italiano. Tudo checado e revisado ao extremo. Mas parece que essa gente tem uma predileção em me parar. Uma vez tinha um professor no Emílio Meyer que dizia que minha cara tinha três estágios: aprontou, está aprontando ou vai aprontar. Sinceramente não concordo mas por vezes sinto que sou uma voz solitária nessa defesa.
A primeira vez que fui sozinho aos EUA estava tranquilo. Já havia entrado mais de uma vez e nada de grave havia acontecido. Minto! A primeira vez o cara da imigração ficou invocado como podia eu ficar três meses de férias em Montana. Como? Imagina como um americano que, com sorte, pode tirar no máximo 15 dias de férias, iria entender um brasileiro – com passaporte italiano – ficar TRÊS! meses de férias? Não entrava na cabeça dele. Foi aí que eu mostrei um gibi do Radicci para ele. Ele folhou, olhou, coçou o bigode e foi verificar no computador. Ficou uns 10 minutos olhando, olhando sem dizer uma palavra. De repente se virou pra mim sorrindo e disse:
– Mas é um Homer Simpson italiano!
Entrei.
Mas ainda houve outra vez. Entrava sozinho pelo aeroporto de Houston, Texas. Havia ensaiado tudo que diria. Alguém havia me dito que era importante ressaltar que tinha um lugar para ficar. Iria ficar na casa de amigos em Seattle e tinha um papel com nome, endereço, cep e tudo mais. Na hora o oficial da imigração começou uma série de perguntas. Respondia com cuidado e com os papéis todos para comprovar. Finalmente então ele perguntou onde eu iria ficar. Mostrei o papel com endereço e disse:
– Vou ficar na casa de amigos.
Então o oficial me olhou e perguntou:
– How long will you be staying? (Quanto tempo você irá ficar? )
E o burraldo aqui achou que a pergunta se referia a quanto tempo eu conhecia meus amigos e então cometi a pior resposta possível à uma pergunta de quanto tempo você pretende ficar nos EUA:
– Many , many years!!! (muitos e muitos anos!)
Levou tempo pra consertar a burrada, mas por fim entrei. Se tivesse prestado atenção nas aulas de inglês no Carmo, nada disso teria acontecido.