Rafael Madeira é engenheiro químico. Aos 41 anos, viu na gastronomia uma oportunidade de retornar ao mercado de trabalho depois de perder o emprego na indústria.
– Sempre gostei de cozinhar, então acho que pode ser uma chance de mudar de ramo, mas não precisa necessariamente ser em um restaurante – afirma, cogitando a possibilidade de abrir um negócio na área de eventos.
Morador de Caxias do Sul, Madeira buscou na Escola de Gastronomia UCS-Icif, em Flores da Cunha, as técnicas para se tornar um chef de cozinha, carreira que cada vez mais desperta o interesse de adeptos de forno e fogão. Parceria entre a Universidade de Caxias do Sul e o Instituto de Culinária Italiana para Estrangeiros (Icif, na sigla em inglês), a instituição é apenas uma das dezenas no Brasil que servem como porta de entrada para o mundo das panelas. Porém, há muito menos glamour na profissão do que se vê nos programas que pipocam na TV e na internet.
– Os reality shows ajudam a dar um pouco de glamour, mas não tem muito disso na realidade. Tem é muito trabalho – afirma o chef Charlie Tecchio Colonetti, coordenador do curso de chef de cozinha internacional.
Com duração de 800 horas, ao longo de seis meses, o curso é dividido em módulos semanais, pela manhã e tarde, nos quais são abordados, na teoria e na prática, temas como técnicas de corte, boas práticas, métodos de cocção, carnes, panificação, charcutaria (elaboração de embutidos) e geleias e conservas, entre outras. O programa contempla ainda quatro módulos de cozinha italiana, nos quais os alunos aprendem sobre pratos como nhoque, massas, carnes, risotos e peixes e dois sobre bebidas, incluindo enogastronomia, cervejas e destilados e suas harmonizações com alimentos.
Na reta final, os aprendizes passam por três semanas de serviço de sala, com lições teóricas e práticas sobre planejamento de cardápios, organização de eventos, calcular custos e detalhes importantes como dobrar guardanapos e montagem de mesa (disposição de talheres, louças e utensílios).
– Buscamos trabalhar com a realidade e procuramos mostrar como é o dia a dia de uma cozinha, um lugar onde, dependendo da situação, pode-se ficar 13, 14 horas em pé, no calor de um fogão – explica Colonetti.
Banca
No começo de dezembro, o Almanaque acompanhou a banca final do curso, na qual os 14 alunos tiveram 1h15min para preparar para três avaliadores, entre eles um repórter do caderno, um filé grelhado com batata duchesse e molho bernese. Uma oportunidade interessante para testar o nível dos cozinheiros. Apesar de terem passado pelas mesmas aulas e aprendido as mesmas lições, houve diferenças consideráveis, seja no ponto da carne ou na execução dos acompanhamentos.
– As pessoas vêm com a ideia de que vão sair daqui chefs de cozinha, mas tem muito caminho ainda percorrer. Muito aprendizado. A partir do momento em que você tem o domínio das técnicas, você consegue usar da sua criatividade – salienta o coordenador.
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João Victor de Carvalho Moraes, 29, atravessou o Brasil para estudar na Serra. Natural de Belém, capital do Pará, e graduado em Gastronomia pela Faculdade Metropolitana de Manaus, no Amazonas, decidiu vir para o Rio Grande do Sul para aperfeiçoar-se na área.
– Queria uma oportunidade de respirar cozinha o dia todo e vi que aqui era um bom lugar – afirma.
Quando criança, observava e mãe fazendo comida e, quando ela não estava em casa, cozinhava para o irmão. Apreciador de carnes, pretende retornar ao Sul em breve para trabalhar na área e, quem sabe, abrir um negócio próprio pois, segundo ele, aqui o mercado de trabalho é mais amplo e melhor remunerado.
– Um bom chef sabe valorizar a origem dos ingredientes. Olhar o cliente satisfeito com o prato que você preparou dá a sensação de dever cumprido – comenta orgulhoso do ofício que escolheu.
– Hoje em dia o simples é mais.
Um das mais jovens da turma de formandos, Jéssica Meneguzzi, 19 anos, enfrentou uma verdadeira maratona diária para concluir o curso. Das 9h às 17h, frequentava as aulas em Flores da Cunha. Das 18h30 às 23h, Jéssica trabalha na cozinha do Dall’Onder Vittoria Hotel, em Bento Gonçalves.
– Tudo na cozinha é surpreendente, desde o mais simples dos ingredientes – reflete ela, citando a redução de desperdício com o melhor aproveitamento dos insumos como um dos aprendizados do curso.
O pai é um dos principais incentivadores de Jéssica na carreira. Quando criança, ela utilizava um escorredor de louça como apoio para ficar na altura do fogão e observá-lo cozinhando. Na adolescência, preparava molhos incrementados para o macarrão instantâneo:
– Sempre gostei de cozinhar. Antes da escola de gastronomia fez um curso no Senac para ter certeza de que estava na carreira certa. Gostei cada vez mais. Nunca tive outra opção. Sempre soube que esse seria o caminho.