Já sei o que você deve estar pensando: de onde ela tirou um livro com um nome desses, Os Olhos Amarelos dos Crocodilos? Bem, a resposta correta (embora soe metida a engraçadinha) é que foi das prateleiras de uma livraria. Sim, sou daqueles tipos estranhos que gostam de entrar numa livraria e ficar horas mexendo nas estantes, descobrindo obras e autores ali escondidos e que vão além dos best-sellers expostos com destaque nas vitrines. Gosto de garimpar histórias diferentes, autores desconhecidos e títulos que me intriguem - como esse.
Pois bem. Os Olhos Amarelos dos Crocodilos (Suma de Letras, 464 páginas, R$ 36,90) é um livro da escritora francesa Katherine Pancol, e, como a maioria dos livros ou filmes franceses, procura fugir um pouco do convencional, a começar pelo título. Diferentemente do que se poderia imaginar, essa não é uma história sobre crocodilos, nem mesmo sobre animais - embora eles (os crocodilos) até apareçam rapidamente, de uma forma, digamos, coadjuvante. É uma história sobre família, mentiras, autoestima e descoberta de quem se é de verdade (algo bem à francesa, convenhamos).
A trama gira em torno de duas irmãs, Iris e Joséphine. Iris é linda, rica, elegante, sofisticada e com um ótimo casamento, vivendo uma vida fútil e de aparências. Joséphine é, em tudo, o oposto da irmã: na faixa dos quarenta anos, com uma filha adolescente com quem não se entende, acaba de enfrentar um divórcio difícil e não se acha nem um pouco atraente. Inteligente, Joséphine é historiadora e vive sempre com problemas financeiros, em especial depois que o ex-marido a trocou por uma mulher mais nova e foi morar na África do Sul, com a ideia mirabolante de criar crocodilos (aí é que eles entram).
Um dia, numa festa, Iris - que precisa ser sempre o centro das atenções - começa a contar vantagens e diz que está escrevendo um livro. Seus amigos se interessam e querem ver a obra. Para não voltar atrás, e incapaz de realmente criar uma história interessante, ela corre em busca do socorro da irmã. Sabendo das dificuldades que Joséphine enfrenta para pagar as contas, acaba convencendo-a a escrever um romance histórico com seu nome na capa, em troca de dinheiro suficiente para viver com mais tranquilidade por uns tempos. O livro é lançado, como se Iris fosse a autora, e, logo vira sucesso de crítica e de público.
Enquanto Iris dá mil entrevistas e vira celebridade, Joséphine se divide entre o sentimento de orgulho porque o livro que escreveu foi bem aceito e a tristeza por não poder contar a verdade para ninguém. Como se não bastasse, tem de lidar com o desprezo cada vez maior da filha, com os encontros e desencontros com um homem interessante e misterioso e com as exigências de sua própria mãe tirana.
Com momentos dramáticos mesclados a outros bem divertidos (tem uma história relativa à vizinha de Josephine que valeria um livro à parte), Os Olhos Amarelos dos Crocodilos é leitura das mais interessantes (e, em certos momentos, angustiantes). Gostei muito do livro, e, por isso, fiquei empolgada quando descobri, dias atrás, que ele acabara de virar filme, com direção de Cécile Telerman e elenco incluindo nomes como Julie Depardieu (Josephine), Emmanuelle Béart (Iris) e Patrick Bruel. Infelizmente, o filme não veio para Caxias do Sul, e fiquei na espera... Para dar um gostinho, selecionei foto de uma cena e compartilho com vocês, acima.
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Em tempo: acabo de pôr na lista de próximas leituras o novo livro de Umberto Eco, Número Zero (Record, 208 páginas, R$ 35). A nova obra do autor do já clássico O Nome da Rosa mal foi lançada e já alcançou, na semana passada, a segunda colocação na lista de mais vendidos de ficção do site especializado Publishnews - é uma das raras ocasiões em que me sinto tentada a ler um dos "mais vendidos".
A trama se passa em Milão e inclui elementos típicos das obras de Umberto Eco, sempre afeito a enredos que falam de conspirações e sociedades secretas: a morte do papa João Paulo I, um golpe de Estado, o suposto cadáver de Mussolini, a CIA, terroristas, um jornalista paranoico e fatos inexplicáveis que parecem inventados (ou seriam mesmo inventados?).
Uma curiosidade: me chamou a atenção que esse livro tem bem menos páginas que as outras obras do escritor italiano, apenas 208, enquanto a maioria de seus romances anteriores girava entre 450 e 550 páginas (O Pêndulo de Foucault tinha mais de 600).
Dica de leitura
Maristela Deves: Duas irmãs, uma proposta e um livro
"Os Olhos Amarelos dos Crocodilos" é uma história bem ao estilo francês
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