No amanhecer de uma segunda-feira qualquer eu acordei sem teto, sem chão. Minha cama flutuava no mar aberto, meu lar. Uma chuva caía torrente do invisível firmamento, me inundei. Por consequência, eu desaguava em enxurrada num abismo que formou cachoeiras das palavras que eu não disse e dos sonhos que me acovardei a buscar. Tudo para mim naquela manhã triste era não estar e não ser.
Sabe, essas segundas tristes, que podem ser quintas ou sextas e até mesmo domingos, são da norma, é justo que existam, mas não podemos permitir que elas sejam comuns. O universo se firma em frequência e é na repetição que nos forjamos criaturas racionais. É de suma importância vigiar o que estamos permitindo que a vida faça de nós. Não merecemos nada mais que força íntima e infinita para seguir.
Sou escritora, mas não sou hipócrita. Escrevo porque sinto (e muito), mas vivo pois racionalizo e é na razão que galgo minha existência cheia de boletos, livros de ponto e afazeres mil. Sou só uma mulher qualquer que escreve tentando se encontrar no outro e, assim, aplacar seu imenso vazio.
E, uma segunda-feira triste, geralmente, é o cúmice do ápice de uma sequência de dias difíceis. Pelo menos, comigo é. Enfrentei mais leões do que se fosse uma zebra na Savana em tempos de fome nos dias que precederam àquela agonia. Venci todos, contrariando minha própria expectativa. Venci mais no método do que na fé. Venci dando um passo após o outro. Acordando, levantando e andando. Mas, naturalmente, a gente se esgota de tanto caminho, de tanto caminhar.
A sensação que eu carregava naquele momento de inexistência era exaustão, uma não vontade de seguir (pelo menos, não ali). Enquanto eu estava imersa na barrela que a chuva deixou, me lembrei do quanto odeio umidade e me reergui.
Nada é mais potente para nos pôr de pé do que o desconforto. É que desconforto é limite, é preciso senti-lo, ouvi-lo e saltar sobre ele. Nós, como seres que viemos com missão nata de ultrapassagem, ao sentirmos linhas limítrofes, temos tendência natural a buscar superação. Coisas evolucionistas dessas que a ciência sabiamente conta, entende?
Bom, foi o que se deu comigo naquela manhã. Senti pesado o desconforto, vi que na estática nada melhoraria, me levantei. Tomei um longo banho quente e escutei minhas músicas favoritas. Num teatro de máscaras, refiz minha esperança, dissimulei fé até a hora do almoço. Comecei a acreditar que tudo poderia ser diferente na semana que viria.
Racionalizei e, com afeto, criei uma estratégia de sobrevivência. O que me deixa feliz? Pensei. Elaborei um plano de mínimas alegrias e muito trabalho, segui. Com o plano em execução, dia após dia, o final de semana chegou. E eu venci, meio coxa, arrastando minhas vivências, acumulando risadas, frustrações e brevidades que o privilégio de respirar entrega.
Enfim, cá estou, carregando o fardo e as benesses de reinar soberana sobre as terras quase sempre férteis da minha existência.