Um parto. Um verso. Um beijo. Um dia a menos.
Dentro do elevador, nos 30 segundos que levo pra descer do 12º andar ao térreo, a caminho da garagem, me dei conta de que vou torrar boa parte da minha vida dentro de um elevador. Subir e descer, desviando os olhares constrangidos por dividir micro espaços com desconhecidos, enclausurados em uma caixa de metal, eis a sina dos tempos pós-modernos.
E, todo dia, um dia a menos. E mais elevadores pelo caminho. Porque sempre há um elevador pra atravancar nossos (des)caminhos.
Elevadores que levam desesperados à porta de analistas, psicólogos e psiquiatras. Elevadores que devolvem a serenidade segundos antes de pisarmos em casa. Elevadores que atestam a cura do maligno câncer diante do oncologista incrédulo com a reversão da morte iminente. Elevadores que aceleram corações dos que sofrem com a claustrofobia. Elevadores que desaceleram corações ansiosos. Elevadores que atrasam o socorro dos que estão à beira da morte.
Videntes. Crentes. Apóstatas. Feridos. Delirantes. Todos avançam, um dia por vez. Um dia a menos. Nem sempre.
Monges não precisam de elevadores. Elevam-se sentados, silenciosos. Acomodam-se inertes e metamorfoseiam pensamentos esquivos e doloridos em quietude. E paz. Não usam poções mágicas. Meditam. Subvertem o "conheça a si mesmo", libertando-se de si mesmos.
Estimando que eu gaste 30 segundos (e realmente gasto isso, já cronometrei) pra sair do 12º andar e descer até o térreo, e mais 30 segundos pra subir e voltar ao lar, por dia, meu desperdício de tempo é de 1 minuto. Isso só no elevador do condomínio onde moro.
Se eu computar os 365 dias do ano, meu tempo perdido será de 21.900 segundos, ou tão simplesmente 365 minutos, ou ainda, 6 horas e 5 minutos. Ou seja, perco um dia inteiro de sono, por ano, porque a pós-modernidade me sujeita a usar o elevador. Esse trágico número levando-se em conta apenas a minha saída e volta pra casa, descontando outros elevadores que uso pra visitar amigos, parentes, médicos, analistas, videntes e etc. Fora os monges.
Estimando que eu chegue aos 75 anos, o que seria um invejável lucro, tendo em vista o tempo de vida médio de um homem brasileiro, de acordo com dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), de aproximadamente 72 anos, eu terei passado 19 dias dentro do elevador, apenas pra sair e voltar pra casa, excetuando as viagens dentro de outros elevadores pra visitar amigos, parentes, médicos, analistas, videntes e etc. Fora os monges.
E dentro do elevador, um parto, um verso, um beijo. A mesma selfie. Um dia a menos.