Este dito "novo normal" me assusta. Parece que vai levar tudo por diante. Aquela história de jogar a água do balde com a criança dentro. Tenho saudades de muita coisa do "velho normal". Tenho sim. Porque "velho" não é intrinsecamente ruim. E "novo" não é intrinsecamente bom. É preciso ponderar as palavras. Cada uma delas tem sua carga simbólica e seus aspectos positivos, negativos, neutros, um pouco para cá, outro pouco para lá. É preciso apalpar as palavras, pois há quem se aproveite dessas conotações para ludibriar. Vê-se isso, por exemplo, quando se bate na tecla da “nova política”. O que define uma boa política não é o adjetivo “novo”, que pode ser usado com “velhas” intenções.
A música popular brasileira, em décadas recentes, celebrizou e celebrou o "novo". Celebração justa, aliás. O tempo era apropriado. Depois, esqueceu-se do "novo" e passou a cantar a sofrência. "O novo sempre vem", escreveu Belchior, cantou Elis. Já faz algum tempo." É você que ama o passado e que não vê que o novo sempre vem." É que ali, naquele momento, virada dos 70 para os 80, “novo” tinha uma carga simbólica essencial. Aliás, se dirá que o "novo" e o "velho" sempre terão carga simbólica. Está certo. A questão é até que ponto esta carga simbólica, dentro de um contexto, é importante e essencial. Palavras, é preciso estar atentos a seus significados e contextos.
Agora, na pandemia, há um contexto bem claro, e em cima dele logo se impôs o "novo normal". Reluzente "novo", às vezes se parece com um pavão. “Eu vejo o futuro repetir o passado / Eu vejo um museu de grandes novidades.” Descrição sempre atual e cirúrgica de Cazuza. É preciso estar atento ao brilho das palavras. Então, “novo normal” se aproveitou do contexto. Ocorre que aquilo que importa, que é importante, está, sim, em parte no “novo”, mas está também no “velho normal”, ou no normal anterior. Assim como estão lá e cá os “velhos” hábitos e comportamentos.
Tenho saudade de muita coisa do “velho normal”. Preocupa-me que se percam no pós-pandemia. Saudade do encontro, do abraço, do afeto, da convivência, do ir ao encontro dos outros sem maiores restrições, do ir às ruas, do ir à praia, ao encontro da natureza sem máscara, de parar quando quiser, de ficar do lado de dentro ou do lado de fora, das aglomerações essenciais, das celebrações, das boas vibrações. Em especial, preocupa-me que se embaracem ou se percam agora, neste pós-pandemia, neste “novo normal”, as manifestações físicas de afeto. Tudo isso residia no normal de antes, no “velho normal”.
Muita saudade. Que voltem daqui a pouco.