Um dos vídeos mais assistidos terça-feira (30) aqui na Serra gaúcha foi o da prefeita de Santa Tereza, Gisele Caumo: às 7 da manhã, durante uma live nas redes sociais para alertar sobre os perigos de mais uma cheia no Arroio Barramansa, a ponte que ligava o município à cidade de São Valentim do Sul foi engolida pelas águas furiosas ali mesmo, ao vivo. Se não tivesse sido gravado em imagens e sons, talvez faltassem palavras para descrever toda a desolação, a vulnerabilidade, o cansaço, o medo e a total impotência de um ser humano diante de uma cena como aquela.
Enquanto falava aos concidadãos, o olhar já sem brilho da jovem prefeita revelava toda a tristeza de ter que enfrentar mais uma enchente devastadora nesses intermináveis meses de El Niño. É impossível não se comover assistindo ao vídeo (ainda disponível nas plataformas digitais do Pioneiro e de GZH). Fico pensando no quanto é difícil ser uma líder em tempos tão desafiadores como esse, com a obrigação de proteger e de tentar lutar, de alguma forma, contra um inimigo imbatível como a fúria da natureza.
Mesmo morando a vida inteira aqui na Serra gaúcha, nunca estive presencialmente em Santa Tereza, mas aprendi muito sobre a pequena cidade quando comecei a pesquisa da minha dissertação de mestrado no começo de 2002. O município aparecia em vários artigos acadêmicos e publicações como uma das localidades do mundo onde a cultura material e a cultura imaterial da imigração italiana se encontravam perfeitamente preservadas. A resistência dos saberes do século 19 que perduraram por meio da oralidade — como lendas, cantos, orações e receitas de culinária típica — eleva Santa Tereza ao patamar de museu vivo, a céu aberto, aninhado naquele belo vale. Sem dúvida, trata-se de uma joia preciosa da nossa região.
Ano passado pude admirar Santa Tereza de longe, num vislumbre na beira de uma estrada, em meio a compromissos profissionais, mas querendo muito estar lá. Também era outono, bem mais seco que este, ainda sob os efeitos da estiagem do fenômeno La Niña. Mal sabia que seu irmão gêmeo perverso, o El Niño, logo arrancaria Santa Tereza dos artigos acadêmicos para jogá-la no noticiário nacional ao lado de outras cidades da região: desde setembro passado, foram três grandes cheias devastadoras no Vale do Taquari. Não há tempo sequer de reconstruir o que as águas levaram, e um novo temporal, com consequências arrasadoras, coloca de novo os moradores de Santa Tereza de joelhos.
Gostaria de conversar com a prefeita Gisele para ouvir dela a resposta para perguntas que me faço sempre que vejo uma comunidade enfrentar tamanha catástrofe: Como se reerguer? Como ter resiliência? Como não desistir de uma vez por todas e simplesmente mudar a cidade inteira para outro local? Confesso que eu já teria desistido, mas o exemplo dessas pessoas incansáveis, que se recusam a se esconder, que não ficam paralisadas em pânico, esse exemplo me motiva a me levantar sempre. As tempestades passam. O povo fica.