O presidente da Associação Brasileira de Sommeliers no Rio Grande do Sul (ABS-RS), Júlio César Kunz, 39 anos, é um jovem velho conhecido do setor. A começar por pertencer a uma família que fundou a Vinícola Petronius, dedicada à elaboração de destilados e vinhos finos, criada na década de 1930 na Serra Gaúcha. Mas nem todo mundo que o conhece do mundo dos vinhos tem ideia de todas as outras áreas de atuação deste profissional que também é psicanalista.
Sua primeira formação como engenheiro de alimentos apenas abriu portas para a busca de uma série de outros conhecimentos que tornam este profissional tão diverso como os vinhos de países e regiões do globo terrestre que ele ensina como professor de sommeliers. Em uma manhã chuvosa da última semana, ele abriu as portas do seu consultório no bairro Exposição, em Caxias, e se dispôs a inverter o papel de ouvinte para falar sobre a sua própria trajetória.
Contou, por exemplo, que ao concluir a primeira formação, quando já trabalhava abrindo mercado para exportações de vinhos brasileiros, pediu de presente a obra completa de Sigmund Freud.
— O que sempre me encantou no vinho é o que ele diz sobre a gente. Me interessa mais saber do que o vinho provoca nas pessoas do que o vinho em si, as sensações, as emoções... E isso conversa muito com as áreas que atuo. O que um profissional de vinhos e um psicanalista fazem? Criam um ambiente favorável para a pessoa se conhecer — compara.
Nesta busca de autoconhecimento, Kunz percorreu um longo caminho que incluiu muita vivência internacional, primeiro na Argentina ainda na graduação.
— Voltei com a certeza de que não seria engenheiro mas me achava muito velho com 20 anos para trocar de profissão (risos). Então eu fui até o fim, mas comecei a fazer umas cadeiras de Direito. Em criminologia, um professor falou sobre o complexo de Édipo e eu comecei a ler Freud — relembra.
Nesta mesma época, já começava a estudar por conta línguas estrangeiras, do grego ao latim. Hoje, Kunz fala inglês, espanhol, italiano e francês fluentemente. Apesar da descendência alemã, destaca que esta foi a língua que não foi capaz de dominar.
O conhecimento em idiomas não só o credenciou para fazer o mestrado pela Organização Internacional da Uva e do VInho (O.I.V.) na Europa, mas também para conversas marcantes, como a vez em que ligou para o presidente da Food and Drug Administration (FDA), a agência federal do Departamento de Saúde dos Estados Unidos, quando tinha menos de 20 anos, para resolver uma dúvida técnica sobre o registro para vender em solo americano a caipirinha fabricada em Flores da Cunha. Ou para o momento em que entrevistou Steven Spurrier, o britânico que ficou mundialmente conhecido por promover o Julgamento de Paris, que “quebrou” a hegemonia do vinho francês no mundo, a partir de 1976.
— No meio de uma feira, ele (Spurrier) tirou uma hora para conversar comigo e ainda me explicar como fazer uma entrevista — conta.
No retorno ao Brasil, Kunz ainda trabalhou com consultorias para vinícolas, foi diretor-executivo da Dunamis, e começou a faculdade de Filosofia que, assim como a de Direito não concluiu, e que só reforçaram que deveria ir para a Psicanálise. Após a formação, ganhou o Prêmio Tuti 2021 e o Premio Doro 2022, ambos conferidos pelo Centro de Estudos Psicanalíticos de Porto Alegre/Serra.
O período também despertou o seu lado artista, com publicação de livro de poesias e atuação como músico, mas nunca deixando de lado o trabalho no setor de vinhos. E nem as viagens...Recentemente, voltou de Bordeaux, onde foi convidado para ser o embaixador de uma das principais regiões de referência da França em vinhos. A região que popularizou no mundo uvas como Cabernet Sauvignon e Merlot. Agora, Kunz vai ajudar a difundir os conhecimentos sobre as características dos produtos oriundos da margem direita ou esquerda de Bordeaux para os consumidores de vinhos brasileiros que assim, como Kunz, gostam de conhecer cada vez mais. Seja das suas raízes, seja do que ainda pode encontrar pelo mundo...