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Dilma Tessari, médica obstetra e ginecologista, diretora-superintendente da Unimed Nordeste-RS, é uma referência na área da saúde na Serra. E uma das suas principais marcas é a disponibilidade.
Mesmo se dizendo abatida poucos dias após ser diagnosticada pela primeira vez com covid-19, ela não desmarcou a entrevista. Disse que passou dois anos dentro dos hospitais sem contrair o vírus, mas ele acabou invadindo sua casa nos últimos dias. Aos 75 anos, a rotina que mantém comandando um dos principais núcleos de cooperativa médica do país enquanto segue no consultório e realizando partos reforça sua dedicação e vocação.
Por telefone, ela resgata, a seguir, os principais destaques de sua carreira de mais de 50 anos na Medicina.
Por que a Medicina?
Sou das pessoas que defende que Medicina é vocação. Eu não tenho ninguém na família da Medicina. Eu lia muito, e essas leituras fazem você se voltar para dentro de si. E foi nelas que busquei a inspiração, em especial no livro Deuses de Barro, de Lloyd C. Douglas. Naquele tempo, ser médica era muito desafiador. Nem minha família acreditava nisso. Sou natural de Cazuza Ferreira, fui para Caxias do Sul para estudar, onde conclui o científico e o curso técnico de contabilidade no Colégio São Carlos. Passei no vestibular da Faculdade Católica de Medicina de Porto Alegre, hoje Faculdade de Ciências Médicas. Como era paga, o curso de contabilidade serviu para eu trabalhar na tesouraria da faculdade e me ajudar a pagar os estudos. A Católica era ligada à Santa Casa e entrei na residência de ginecologia e obstetrícia ali.
Em mais de 50 anos de profissão, chama a atenção que nunca deixou de fazer partos.
Eu sou viciada, já diminui o ritmo, mas eu gosto da obstetrícia. Eu me revitalizo no parto.
Por que escolheu Caxias para viver e trabalhar?
Eu voltei para Caxias em 1974, no final da gestação do meu primeiro filho, Marcelo. Em 1975, grávida do meu outro filho, o André, já comecei a dar aulas na Universidade de Caxias do Sul. Já era docente na Católica em Porto Alegre. Sempre em cima do estudo, foquei minha vida inteira. Entrei em um momento ainda inóspito para o trabalho da mulher. Os médicos homens dominavam, eram poucas mulheres no curso. Sou feliz de ter trabalhado e conquistado os espaços por onde transitei. Hoje, ao contrário, tem mais mulheres que homens nas faculdades. A vocação de cuidar está muito dentro da mulher. O que rege é a competência. Além dessa frente na educação, mantive aqui o consultório e a atuação no serviço público, que já havia iniciado na Capital. Lá, em 1973, comecei minha trajetória no Centro de Saúde Modelo, na prevenção de câncer. Vim transferida para Caxias, onde ajudei a montar o ambulatório de prevenção no Centro de Saúde da Rua Pinheiro Machado. Em 1988, fui chamada para a Delegacia de Saúde onde trabalhei com o médico Milton Comassetto (in memoriam). Ele me ensinou a ter um olhar geral para a saúde. Ele dizia que eu não podia pensar só Caxias, precisava olhar a saúde de outros 48 municípios. Ali não fiquei só na ginecologia e obstetrícia, eu tinha um olhar geral para outras patologias, a epidemiologia, a vacinação. E eu gosto muito disso, das instituições que a gente pode acreditar.
De funcionária pública, se tornaria também uma gestora pública durante quatro anos como secretária da Saúde no governo de Alceu Barbosa Velho.
Eu sempre atuei com saúde pública ao lado do consultório. Também entrei para as cooperativas. Além da Unimed, fui sócia-fundadora da Unicred, sou da Associação Médica (Amrigs). Participei da organização, na área da GO (ginecologia e obstetrícia) do Hospital Geral. Fiquei na gestação de alto risco ali até sair para a Secretaria da Saúde em 2013. Eu estava dentro da enfermaria quando recebi o convite do prefeito Alceu, que era uma pessoa que eu não conhecia. Minha indicação foi técnica, não tenho partido político até hoje. Ele queria dedicação exclusiva e eu disse que não largaria o consultório. Uma semana depois, voltou atrás e disse que eu seria a secretária. Fiz a melhor gestão que pude dentro das limitações com a diminuição de arrecadação e de recursos públicos.
Essa experiência de gestão pública a credenciou para o desafio no setor privado?
Eu terminei a gestão em 2016, estava com o pé quebrado, fazendo fisioterapia, quando a Unimed me chamou. Certamente por esta visão administrativa que desenvolvi após sair da academia. Eu gosto do executivo, gosto de trabalho intenso.
Então foi a pessoa certa para o comando da Unimed em anos de pandemia?
O ensinamento da pandemia é o da agilidade. Mesmo na cooperativa, com decisões em muitas instâncias, conseguimos uma sintonia muito fina com a linha de frente de atendimento. Estávamos ao lado do paciente e diante do inimigo, enfrentando com muita coragem, pelas nossas valorosas equipes! É difícil opinar sobre o coronavírus, mas certamente será uma doença que vai ficar endêmica (que estará sempre presente). Acho que vai entrar no diagnóstico de rotina entre tantas outras doenças.
Você está em casa se recuperando da covid-19, mas como tem sido sua rotina?
Todas as manhãs estou na Unimed e em algumas tardes também. Nos demais horários estou no consultório. E continuo fazendo os partos, inclusive o normal, que é o meu xodó. Hoje as minhas pacientes são meninas que eu fiz o parto e que agora estão tendo bebê. Me emocionei bastante nesta semana quando uma fisioterapeuta do Serviço de Atenção Domiciliar Unimed veio fazer fisioterapia respiratória na minha casa. Em 1998, eu ajudei a montar este serviço. Aí ela me disse que eu tinha feito o parto dela. Quando ela me disse o nome da mãe, consegui me lembrar de detalhes. Me emocionei quando lembrei da história e vi a fisioterapeuta porque ali estava uma pessoa que eu ajudei a nascer e representando um serviço que ajudei a fundar.