Ao completar 200 edições, o caderno +Serra abre espaço para discutir o futuro da economia na Serra. A proposta desta entrevista especial é mostrar também que a Serra é protagonista no futuro de um dos segmentos que mais movem o país, o de logística. Se a mobilidade elétrica é apontada como um divisor de águas da indústria automotiva, no ramo pesado é um processo ainda mais desafiador, em que as Empresas Randon estão saindo na frente, com o projeto de uma carreta com eixo elétrico.
A tecnologia do semirreboque com sistema de tração auxiliar elétrica é assinada pela Suspensys e quem comanda a unidade do grupo e toda a divisão de suspensão e rodagem das Empresas Randon é Eduardo Dalla Nora. A seguir, conheça um pouco mais de quem está a frente desse desafio e de outras estratégias importantes.
De estagiário a executivo, como foi a tua ascensão no grupo Randon?
Sou da terra de Erico Verissimo. Pouca gente sabe que ele é de Cruz Alta. Eu brinco que Caxias tem uma referência muito grande de cruz-altense que é a principal avenida, a Júlio de Castilhos. Estou em Caxias há 21 anos. Isso quer dizer que completei, no dia 1º, 21 anos de Randon, porque eu vim direto para trabalhar aqui. Comecei como estagiário na Randon Veículos, na área de mar keting. Fui pequeno empresário antes da Randon, na área de alimentação e vestuário. Tinha uma fábrica de pães e uma malharia. Minha formação é de Administração de Empresas, mas eu queria ser engenheiro civil. Quando fui funcionário público, trabalhei na Secretaria de Obras, mas como Cruz Alta não tinha essa formação de engenharia, só tinha em Santa Maria, e a universidade federal era muito concorrida, acabei não conseguindo fazer. Fiz Administração, mas não me arrependo. Mas meu mundo hoje é também de engenheiro, de engenheiro mecânico. Mas eu queria fazer um estágio bom de final de curso, já que a base da minha formação era economia. Tinha muito interesse na carreira executiva. Na época, tentei Basf, Randon e John Deere. A John Deere era mais perto, no segmento agro, mas não fui selecionado. Foi na Randon que consegui um estágio não remunerado. Isso foi em julho. Em agosto, a Basf me chamou, mas eu optei em ficar no Rio Grande do Sul. Eu tinha ideia de ficar seis meses em Caxias, mas gostei muito do jeito de trabalhar, da cultura, do setor metalmecânico. Hoje sou responsável por uma das diretorias gerais. Ao todo, são quatro divisões. Passei por muitas empresas, a Randon Veículos, Suspensys, trabalhei na Meritor nos Estados Unidos, em 2014, e trabalhei na Randon Implementos de 2015 até o ano passado.
E como foi assumir a nova posição de comando no meio de uma pandemia?
Em fevereiro fui anunciado, e em março veio a pandemia. Um desafio bastante grande pelas incertezas. Trabalhamos sábados, domingos, feriados, reunindo a executiva para gente avaliar os cenários. Por outro lado, tenho 10 anos de autopeças, metade dos meus 20 anos de Randon. O business eu já conhecia. Isso ajudou. Óbvio que a gente aprende muito. Por outro lado, o transporte de carga alavancou e a gente começou a vivenciar uma subida extremamente alta. Quando cai muito é um grande desafio. Mas quando sobe muito também é desafiador. Nós, como Empresas Randon, aproveitamos as oportunidades de mercado. A gente de maneira nenhuma deixou de continuar os investimentos em inovação, em outras frentes, mesmo com a crise pós-covid que ainda não passou. É um desafio muito grande com pessoas, com segurança, com saúde, nos recursos que colocamos para manutenção dos empregos, mas a gente saiu rápido. Não só no nosso setor de autopeças, mas semirreboques também. Hoje não há no Brasil um caminhão que não tenha uma peça ou da Suspensys ou da Castertech.
E o ano também tem sido marcado por aquisições na divisão que comandas.
A maioria delas foi para colocar capacidade na Castertech. Em seis meses, fizemos três aquisições. Foram duas fundições e uma empresa de usinagem. Somos uma empresa que funde, usina, monta sistemas e entrega para os clientes. As fundições hoje no Brasil são limitadas, e grande parte deixou de operar nesse momento de crise. Muitas estão com dificuldades financeiras. Nós não. Estamos investindo. Uma fundição transforma metal e, sem tem problemas, aí limita toda a cadeia. Não tendo usina, não tem chapas, e não adianta fazer carreta. Nós investimos na base. Fornecemos para todas as empresas do grupo e todas as montadoras de caminhões, ônibus e semirreboques. Nosso plano foi investir e investir rápido. São projetos trabalhados há três anos. Agora temos um grande trabalho para operacionalizar, fazer crescer, ganhar mais capacidade. A Fundituba (em Indaiatuba, SP, comprada da Agrale) saiu de zero a 100% de capacidade em quatro meses. A CNCS (de Caxias do Sul), no segundo mês, colocamos o trabalho a toda a capacidade. E a Menegotti (em Schroeder, em Santa Catarina) já compramos com 100% de capacidade. A Caster precisa expandir, nós temos preocupação em dar mais musculatura para as empresas. Com isso, se torna uma das três maiores do Brasil. E temos ideia de expandir mais no segmento agrícola de fundição.
E para a Suspensys, que tem sido protagonista em inovação, o que está planejado?
No ano passado, anunciamos uma nova unidade em Resende (RJ), uma parceria que esperávamos há 25 anos, de entrar para o consórcio modular da Volkswagen. No início do ano passado, começamos a operar em Monterrey, no México, uma unidade com capacidade de expansão gigante, porque o mercado norte-americano é imenso. Mas uma frente muito grande que estamos explorando é a eletromobilidade. Nós estamos modelando, em implementação, um braço de eletromobilidade dentro da Suspensys, um negócio que está crescendo exponencialmente. A nossa carreta elétrica, a tecnologia dela é a da Suspensys em projeto junto com o Centro Tecnológico Randon (o CTR). O diferencial é que ela tem o eixo elétrico. O que estamos fazendo neste ano é implementando dentro da fábrica também os componentes, as baterias. Nós montamos elas. Os componentes hoje são asiáticos. Exige uma parte de fabricação local, dos componentes que condicionam a célula. É um projeto pioneiro de brasileiros, e nós, gaúchos de Caxias, estamos entrando nesse mundo gigante da mobilidade. Isso está potencializando muito a empresa como business e inovação. Uma empresa de tecnologia, que desenvolve “cabeça a cabeça” com as montadoras, desenvolve tanto suspensão como eixo. Normalmente, a maioria das indústrias de autopeças produz sob um desenho da montadora e fabrica. Nós desenvolvemos junto com a montadora. Vamos começar desenvolvendo esse projeto do eixo elétrico regenerativo. Toda vez que você freia a carreta, ele carrega a bateria. Terrenos de maiores subidas e descidas é onde o eixo opera. E estamos falando de carretas de mais de 70 toneladas que ele pode tracionar, com redução de 25% de custo de diesel em alguns trechos. Do ponto de vista do transportador, além da redução de emissão de gás carbônico no meio ambiente, tem a produtividade maior, melhora retorno e mantém tempo de viagem. É o projeto que mais a gente investiu dentro do grupo, e investimentos grandes. Nós começamos aplicando em trailers, mas já temos montadora atrás para colocar o eixo em caminhão. E também colocar fora do Brasil. Somos líder de mercado nesse segmento. Somos referência no mundo em inovação.