Com registro de 271 casos de violência contra a mulher nos primeiros dois meses de 2023, Passo Fundo, no norte do Estado, registra aumento de cerca de 10% em comparação ao mesmo período do ano anterior. De acordo com os dados do juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Passo Fundo, apenas em 2023, foram concedidas aproximadamente 249 medidas protetivas, sendo 88 delas apenas no último mês.
Entre as características da violência se destacam a relação com o uso de substâncias químicas e um possível número significativo de agressores sendo familiares das vítimas. Segundo a delegada titular da delegacia Especializada no Atendimento à Mulher, Rafaela Weiler Bier, o número da violência deve ser ainda maior na cidade por conta da subnotificação:
— Tivemos um aumento de cerca de 10% nos registros, mas o número ainda é impreciso diante daqueles casos de violência que, embora existam, não são noticiados às autoridades policiais. O que percebemos quando do atendimento das mulheres é que na grande maioria dos casos a violência é agravada pelo consumo abusivo de álcool por parte do agressor, bem como pelo uso de substâncias entorpecentes. Tudo isso, somado ao machismo estrutural ainda enraizado na nossa sociedade.
Com a lei que passou a vigorar nesta terça-feira (4), o atendimento a todas as mulheres que tenham sido vítimas de violência doméstica e familiar, crimes contra a dignidade sexual e feminicídio passa a ser feito no formato de plantão 24hs. Na cidade, o serviço já existe na Delegacia de Pronto Atendimento, em que há espaço reservado para o acolhimento das mulheres vítimas de violência de gênero na Sala das Margaridas.
Características que potencializam a violência
Entre o cenário da violência contra a mulher na cidade, a dificuldade no combate está, muitas vezes, em casos em que existe maior dificuldade juridicamente, como quando o agressor se trata de um familiar da vítima. Segundo a coordenadora do projeto Projur Mulher e Diversidade, da Universidade de Passo Fundo (UPF) Josiane Petry Faria, há um número significativo de mulheres que sofrem violência de seus filhos ou netos:
— Fugimos do padrão da violência relacionada ao “amor romântico”, de ex-namorados contra atuais. Temos índices em que a violência parte do filho ou do neto, e nesse caso a medida padrão, que é a medida protetiva, não atende a necessidade. Não há como, judicialmente romper o vínculo entre a família, o que demanda que tenhamos outras estratégias de ação. Nesses casos, as vítimas também não se interessam pela condenação ou prisão do agressor. Elas buscam ajuda para si, e também querem ajuda para o agressor.
Também se destaca a associação com a dependência química, o que potencializa as agressões, segundo o juiz responsável pelo Juizado da Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher de Passo Fundo, Alan Peixoto de Oliveira:
— O abuso de substâncias que causam dependência química tem se revelado potencializador das agressões às mulheres. Por isso, é necessário o desenvolvimento de articulações da rede de apoio, especialmente com a equipe de saúde, com o objetivo de eliminar essa hostilidade.
Essas características serão mapeadas por meio de uma pesquisa que está sendo protocolada pelo Projur. Os dados serão sistematizados para identificar os percentuais, para que políticas públicas possam ser pensadas na cidade. A pesquisa também deverá mapear dados de dependência econômica, quantidade de medidas protetivas e demais espécies das medidas. A previsão é de que os resultados finais sejam entregues em março de 2024.
Os números por tipo de violência
Ao analisar os registros de violência contra a mulher, coletados pela secretaria de Segurança Pública do Estado, é possível observar a oscilação dos números nos diferentes tipos de violência, entre os meses de janeiro e fevereiro de 2022 e 2023. Houve aumento nas notificações de estupro, de três para 12 casos, e de ameaças, de 142 para 173.
Os tipos de violência que registraram diminuição foram os casos de lesão corporal, de 96 em 2022, para 85 neste ano, e de feminicídio tentado, de três para nenhum. Já nos casos consumados, não houve oscilação, permanecendo com um caso em ambos os anos.
Ainda segundo a professora Josiele, a cidade possui números altos constantes em relação à violência contra a mulher e que não se justificam quando entram em comparação aos índices de escolaridade, empregabilidade e Produto Interno Bruto (PIB).
— Passo Fundo é uma cidade de médio porte e temos números de violência muito superiores à média dos municípios, e os números não cedem com o passar dos anos. Nós temos uma rede de acolhimento e de atenção dada às proporções do município, porém, comparativamente, existem modalidades de violência contra a mulher que são maiores que a região metropolitana.
As formas de violência
Para identificar os casos de violência contra a mulher, é preciso entender que existem outras formas de ser violada, além da forma física. Abarcadas pela Lei Maria da Penha, são consideradas formas de violência contra a mulher: violência física, psicológica, sexual, patrimonial e moral.
Onde denunciar em Passo Fundo
Os registros de ocorrências policiais de violência de gênero, violência doméstica ou familiar podem ser feitas presencialmente nas seguintes delegacias:
- Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher: Rua Bento Gonçalves, nº 720, bairro Centro. Atendimento de segunda a sexta-feira, das 08h30min ao meio-dia, e das 13h30min às 18h.
- Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento: Avenida Brasil Leste, nº 2271, bairro Petrópolis. Atendimento 24hs
Demais contatos de rede de proteção em Passo Fundo:
- Juizado da Violência Doméstica: (54) 99988-0249
- Patrulha Maria da Penha: (54) 98423-2056
- Centro de Referência a Mulher: (54) 38425-6383
Serviço Projur
O Projur atende gratuitamente mulheres e a comunidade LGBTQIA+ em situação de violência. São oferecidas orientações e acompanhamento para mulheres que vão comparecer às audiências, assim como ações de prevenção e enfrentamento da violência de gênero para a comunidade em geral, que podem ser solicitadas pelo WhatsApp (54) 3316-8576.