Por Marco Fridolin Sommer Santos, advogado e professor de Direito da UFRGS
A recente notícia sobre diagnóstico de HIV em pacientes transplantados no Rio de Janeiro chocou o país. No último dia 10, foi identificado o primeiro caso de paciente contaminado com o vírus HIV. Em 1999 publiquei um livro onde identifiquei o potencial de risco de transmissão do HIV com transfusões e transplantes de órgãos. Já naquele tempo, inúmeros eram os casos conhecidos de aids e hepatite C pós-transfusional, mas o contágio pelo HIV por meio de transplantes era inédito.
Apesar de controverso, defendemos que a responsabilidade pelo contágio do HIV em transplantes de órgãos feitos pelo SUS é regida pelo direito do consumidor
De imediato, a notícia suscitou debate sobre a identificação dos responsáveis por medidas de vigilância para prevenir novos casos. Em relação às vítimas, deve-se garantir não apenas pronta assistência médica e psicológica, mas também reparação por perdas e danos. A coleta dos órgãos e o teste de triagem do doador ocorreram em 23 de janeiro de 2023, mas a identificação da primeira vítima aconteceu somente em 10 de outubro de 2024. Iniciada a investigação, foram identificados o doador, os receptores, os hospitais, médicos e laboratórios envolvidos.
O art. 2, § 2, da Lei 9434/97 dispõe que o transplante de órgãos só poderá ser autorizado após a realização, no doador, de todos os testes para diagnóstico de infecção exigidos em normas regulamentares expedidas pelo Ministério da Saúde. O contágio ocorreu, pois o doador dos órgãos era portador do HIV. A partir dele, foram transplantados dois rins, córnea, coração e fígado, contaminando seis pessoas. O responsável pelo teste de triagem "falso negativo", feito em 23 de janeiro, era o PCS Saleme Laboratórios, contratado sem licitação.
Apesar de controverso, defendemos que a responsabilidade pelo contágio do HIV em transplantes de órgãos feitos pelo SUS é regida pelo direito do consumidor. No penal, a responsabilidade recai sobre os responsáveis diretos pela contaminação. A contratação sem licitação do laboratório e o exame de laboratório assinado por profissional sem registro suscitam suspeita de fraude e exercício ilegal de profissão.