Por Cassio Grinberg, consultor de estratégia e autor dos livros “Desaprenda” e “Desinvente”
Andei conversando com o personagem de um livro, e não estou brincando: o livro O Velho e o Mar, reputado como o preferido entre os leitores de Ernest Hemingway, conta a história do pescador Santiago que, há 84 dias sem apanhar um peixe, se lança ao mar em seu pequeno barco Gulf Stream a remo – e foi justamente com ele que conversei.
No Desaprenda, e também nas minhas palestras, eu provoco através da história desse pescador que, mesmo há tanto tempo sem pescar um peixe, não tentou nada diferente: não se associou com um pescador de melhor sorte, não financiou um barco maior para entrar mais no fundo – simplesmente continuou todos os dias fazendo exatamente a mesma coisa que fazia no dia anterior e, justamente por isso, obtendo os mesmíssimos resultados.
Muitas perguntas me inquietavam: por que Santiago foi tão cabeça-dura? Por que a gente, durante tanto tempo, também é? O que o motivava a persistir sem resultado? Até onde uma paixão, ou mesmo uma obstinação, pode nos levar?
Eu fui conversar com o personagem do livro através da inteligência artificial
Então eu fui conversar com o pescador através da inteligência artificial: preparei um prompt rápido resumindo um pouco a trama e pedindo que o ChatGPT 4 Omni incorporasse a personalidade de Santiago. E ele foi respondendo, com incrível verossimilhança, a todas as minhas perguntas.
Contou-me que era um obstinado, não conseguia viver sem o mar – a quem, simultaneamente, confiava e temia. Contou-me que, por acreditar no mar e naquilo que sabia fazer, tinha certeza de que sua sorte iria mudar. Admitiu que não estava preparado para vencer a disputa com o marlin de seis metros e que, naqueles dois dias, quis ter um barco em que o peixe coubesse. E no final, desejou que o mar fosse sempre bom para mim.
Em tempos em que se discute se a IA vai terminar com a educação – e inclusive com o emprego dos professores –, temos também oportunidades únicas de nos abrirmos para o novo; para novas jornadas de investigação e de aprendizado, antes que estejamos cansados demais para correr atrás da distância que estamos arriscando deixar o novo, por nosso medo, tomar.