Agirá de forma sensata o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Nunes Marques se confirmar a sinalização que deu ontem de levar a questão do bloqueio da rede social X no Brasil ao plenário da Corte. Dada a relevância, a repercussão e a sensibilidade do tema, é importante que os 11 ministros se manifestem e a decisão final expresse a visão da maioria do colegiado. Cria-se também a oportunidade para a correção de exageros patentes, como a multa de R$ 50 mil a quem utilizar subterfúgios tecnológicos, como VPNs, empregados para outros fins que não apenas a um artifício para acessar o antigo Twitter.
A controvérsia em torno do X não pode se resumir ao embate entre um ministro com poderes demais e um bilionário presunçoso
No despacho, Nunes Marques, relator de duas ações no STF relacionadas à suspensão do X, solicita ainda a manifestação da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Procuradoria-Geral da República (PGR). A consulta indica a disposição do ministro de seguir os ritos usuais. A posição de Marques não impede uma decisão monocrática, mas fica clara a intenção do magistrado de ampliar a análise da matéria. “A controvérsia constitucional veiculada nesta arguição é sensível e dotada de especial repercussão para a ordem pública e social, de modo que reputo pertinente submetê-la à apreciação e ao pronunciamento do plenário do Supremo Tribunal Federal”, escreveu.
O X foi bloqueado na sexta-feira (30/8) por uma resolução individual do ministro Alexandre de Moraes. Ele justificou a medida extrema pela reiterada postura do X de não observar a legislação brasileira e de desrespeitar ordens judiciais. A decisão foi confirmada por unanimidade pela primeira turma do STF, mas o ministro Luiz Fux divergiu sobre a multa a quem utilizar redes virtuais privadas, as VPNs.
Este é um aspecto que exige revisão. Atinge indiscriminadamente quem utilize VPNs mesmo sem o objetivo de burla da decisão, como proteção de dados e de cyberataques, finalidades legítimas. Ademais, se aproxima de práticas de países autoritários que criminalizam o acesso a redes sociais proibidas. E é exatamente o ponto questionado pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) em uma das ações relatadas por Marques. A outra, do partido Novo, contesta a decisão de Moraes por ser pretensamente inconstitucional.
Ainda é questionável e temerária, pela insegurança jurídica que gera, a decisão de Moraes de bloquear as contas da Starlink, empresa de internet por satélite controlada por Elon Musk, também dono do X, devido a multas não pagas pela rede social. As duas companhias têm o mesmo proprietário, mas são independentes. Um recurso da Starlink tem o ministro Cristiano Zanin como relator. Ontem, Zanin pediu manifestação da PGR sobre o tema.
A controvérsia em torno do X não pode se resumir a um embate entre um ministro que concentra poderes demais e tem extrapolado e um bilionário presunçoso que se insurge contra leis brasileira. Por isso, é de extrema importância que o STF se manifeste pela força do colegiado e a Justiça brasileira exerça a prerrogativa de corrigir, ela mesma, eventuais descomedimentos. Defender a soberania do país não significa se aferrar a excessos.