Por Carlos Eduardo Vieira da Cunha, procurador de Justiça, presidente da Fundação Caminho da Soberania
Era dia seguinte em Pequim, na China, início da manhã, quando nos preparávamos para deixar o hotel para mais um dia de trabalho, em missão oficial, quando recebi um telefonema do Rio de Janeiro. No Brasil, era ainda 21 de junho de 2004 e, do outro lado da linha, o jornalista Fernando Brito, assessor de imprensa de Leonel Brizola, emocionado, me comunicava que o ex-governador acabara de falecer, vítima de um infarto fulminante.
Nossa comitiva, chefiada pelo então governador Germano Rigotto, foi tomada de surpresa. Imediatamente decidi me desligar da delegação e retornar ao Rio Grande do Sul. À época, eu presidia a Assembleia Legislativa do Estado e não me passava pela cabeça a possibilidade de não estar no Brasil para me despedir do meu ídolo.
Brizola não conseguiu realizar o sonho de ser presidente da República. Mas não foi ele quem perdeu
Sim, Brizola era meu ídolo. Nasci em 1960 e pertenço a uma geração que viveu a adolescência sob uma ditadura. Quando, em 1979, conquistamos a anistia, eu participava ativamente do movimento estudantil e nossa ansiedade era grande para conhecer pessoalmente os líderes brasileiros que amargaram o exílio. E Brizola era um deles. Nos fascinava a possibilidade de conhecer de perto o líder do Movimento da Legalidade, o jovem governador gaúcho que havia mobilizado a nação brasileira em defesa da democracia em 1961, que tinha feito a reforma agrária no Banhado do Colégio, que encampou, corajosamente, a ITT e a Bond&Share, que havia construído mais de 6 mil escolas, que tentara resistir, em 1964, ao golpe militar.
Estava ele agora, ali, diante de nós, pregando suas ideias, nos conquistando para cerrar fileiras no seu partido para lutar por um Brasil melhor, mais fraterno, justo e igualitário.
Surpreendeu-nos quando, em 1982, decidiu concorrer a governador do Rio de Janeiro. Contra tudo e contra todos, elegeu-se e até hoje é o único político brasileiro a governar dois Estados da Federação.
Brizola não conseguiu realizar o sonho de ser presidente da República. Mas não foi ele quem perdeu. Quem perdeu foi o Brasil, por não ter, até hoje, no comando da nação, alguém que efetivamente coloque a educação como “prioridade das prioridades”.