Agiu de maneira prudente o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Walton Alencar Rodrigues ao embargar o resultado de leilão realizado ontem para a compra de mais de 3,8 mil ônibus escolares rurais, com recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). O certame está envolvido em circunstâncias nebulosas, que exigem esclarecimento por parte do comando da autarquia ligada ao Ministério da Educação e sob controle político do centrão, por meio de apaniguados de próceres do bloco indicados para cargos-chave. Pairam dúvidas especialmente sobre os critérios que levaram inicialmente à definição de valor máximo da concorrência para R$ 2,045 bilhões, apesar de a Controladoria-Geral da União (CGU) e mesmo a equipe técnica do FNDE terem apontado um sobrepreço de R$ 732 milhões. É intrigante que, a despeito do alerta, tenha-se tentado levar a concorrência adiante, indiferente aos avisos de possíveis irregularidades. Trata-se de um significativo montante de dinheiro público que seria desperdiçado, com a aquisição dos veículos por cotações muito acima das de mercado. A população brasileira tem o direito de saber por quê.
É entristecedor constatar que verbas da educação, que deveriam ser empregadas para qualificar a aprendizagem no país, podem estar sendo desviadas
Em um esforço para mesmo assim realizar o leilão, o FNDE recuou e baixou o teto para R$ 1,5 bilhão, valor sugerido anteriormente pela CGU. Esta quantia seria correspondente aos valores de uma concorrência realizada no ano passado, corrigidos pelo Índice de Preços ao Produtor (IPP), indicador de inflação apurado pelo IBGE.
Mesmo assim, a opção do ministro Walton Rodrigues, pela falta das explicações necessárias, foi por uma freada, deliberando que o resultado do certame não deve ser homologado enquanto detalhes que restam misteriosos não são explicados. A decisão cautelar é uma forma de defender os interesses do erário e, ao mesmo tempo, não anular o processo, caso considere-se que, pelos novos preços, o leilão poderia ser considerado válido, e os ônibus entregues e utilizados para o seu fim de ajudar no transporte escolar em comunidades afastadas do interior do país.
É alarmante que, em poucas semanas, surja uma nova suspeita grave relacionada a possível malversação de recursos do FNDE. Em meados do mês passado, veio a público o caso de pastores suspeitos de montar uma espécie de gabinete paralelo no Ministério da Educação, supostamente cobrando propinas para liberar recursos do fundo para prefeituras. Mais de uma dezena de gestores municipais já confirmou os achaques, situação que levou à queda de Milton Ribeiro do posto de ministro. Agora, os indícios são de superfaturamento. É relevante ainda ressaltar que ambos os episódios vieram a público graças à imprensa. Sem o trabalho do jornalismo profissional independente, talvez os brasileiros continuassem alheios aos fatos agora revelados.
Além de revoltante, é entristecedor constatar que verbas da educação, que deveriam ser empregadas com critério e planejamento para qualificar a aprendizagem no país e dar melhores condições para crianças e adolescentes frequentar aulas, podem estar sendo desviadas para fins nada republicanos. Quando isso acontece, é o futuro do país que é roubado.