Se os erros ensinam, há algo que o presidente Jair Bolsonaro poderia aprender com seu antagonista e antecessor Luiz Inácio Lula da Silva: quando não se sabe o que falar, o melhor é permanecer quieto. Lula é lembrado até hoje por ter definido os primórdios da abissal crise econômica internacional iniciada em 2008 como uma "marolinha". O tsunami financeiro a partir dos Estados Unidos fez o PIB brasileiro e a economia global entrarem no terreno negativo no ano seguinte, devastando empresas e milhões de empregos no mundo.
O presidente atual terá contribuído enormemente se apenas não atrapalhar
Agora é Bolsonaro que repete o desdém com um assunto grave, ao tentar minimizar o impacto da pandemia de coronavírus e culpar – como se tornou corriqueiro – a imprensa por, em sua distorcida visão, alardear de forma exagerada o problema que se alastra pelo planeta. A gravidade da situação, é bom lembrar, é atestada pela atenção diária dada ao tema pela Organização Mundial da Saúde, que anunciou ontem o estágio de pandemia, e pelo próprio Ministério da Saúde – pasta que vem agindo de forma transparente e técnica, sem aderir a teorias conspiratórias mirabolantes.
É importante ressaltar que a falta de um jornalismo independente e profissional atrasou o início do combate ao vírus em seu nascedouro na China e, depois, no Irã. As redes sociais, tão incensadas pelo clã Bolsonaro, ajudaram a espargir a informação falsa de que um composto com álcool seria capaz de prevenir o coronavírus. Até ontem, ao menos 44 iranianos morreram graças a essa notícia falsa criada por irresponsáveis que se escondem atrás do anonimato da internet.
Está cristalino que Bolsonaro não exibe as qualidades para liderar uma nação em uma situação de emergência de saúde. Em meio a uma ameaça real, recorre a surrados expedientes como atacar a imprensa e outras nuvens de poeira como fraudes em urnas eletrônicas e convocações a manifestações em seu apoio e contra outras instituições democráticas.
O presidente, que poderia ser um farol para os brasileiros em um momento de apreensão, preferiu clonar a tática inicial de seu ídolo Donald Trump e negar as evidências. Ontem, porém, Trump disse que fará o possível para deter o coronavírus.
Sem estar à altura para conduzir o país em tão preocupante ocasião, Bolsonaro deveria preferir o silêncio a manifestações desastradas e se recolher às coxias da crise. A tarefa de lidar com o coronavírus deve ser deixada para quem entende do riscado e tem passado tranquilidade sem desprezar os riscos do agente infeccioso, como faz a equipe do Ministério da Saúde liderada por Luiz Henrique Mandetta.
É preciso dar ouvidos e seguir a coordenação de quem consiga passar confiança e equilíbrio, agregando sabedoria técnica, atributos que Bolsonaro não tem. Portanto, assim como Lula deveria ter mantido a boca fechada quando desprezou a crise do subprime, um assunto do qual não tinha a compreensão, o presidente atual terá contribuído enormemente se apenas não atrapalhar os esforços para a contenção do vírus. Os efeitos humanos e econômicos da covid-19 em todo o planeta começam a se mostrar devastadores. O Brasil já foi atingido de forma indireta, pelo abalo em outros países, principalmente na China. O pânico no mercado financeiro é mais do que claro. Se e quando a pandemia também começar a se alastrar de forma exponencial pelo Brasil e causar danos maiores às já decepcionantes previsões para o PIB de 2020, Bolsonaro terá garantido também o seu lugar na galeria, onde está Lula, de líderes que preferiram proferir tolices a encarar com a serenidade e a gravidade necessárias uma ameaça de proporções históricas.em 2009.