Por Stefan Staiger Schneider, doutor em Direito, mestre em Estudos Europeus e advogado
Espera-se dos vereadores de Porto Alegre boa-fé e sensatez na análise do projeto de lei 334/2017. Conforme noticiado em Zero Hora, ele visa proibir símbolos religiosos em áreas públicas de repartições municipais. Entre as justificativas do autor do projeto está a laicidade do Brasil.
A Constituição Federal (CF), de fato, define o Brasil como laico. Porém, o seu preâmbulo, onde está o arsenal político e jurídico para toda a organização estatal, menciona Deus da seguinte maneira: "(...) promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição...". Assim Deus é citado na CF. Contudo, Ele não é definido porque, no Brasil, cada pessoa é livre para escolher o seu Deus.
Na exposição dos motivos para o projeto, seu autor escreveu: "As repartições públicas continuam a apresentar símbolos religiosos relacionados ao catolicismo" e "Ainda que seja essa a religião de grande parte do povo brasileiro, não é papel do Estado posicionar-se religiosamente". Isso revela que o vereador, que diz ser religioso de matriz africana, está perseguindo os cidadãos católicos, conduta contrária à CF que configura discriminação religiosa (crime previsto na Lei federal 7.716/1989) e que torna o projeto inconstitucional. E mais: como os símbolos combatidos são comuns a todas as vertentes do cristianismo, a dimensão da discriminação é ainda maior.
Eu tive a oportunidade de me aprofundar no campo do pluralismo religioso com o aclamado professor Joseph Weiler. Doutor em Direito pelo Instituto Universitário Europeu como eu, ele já trabalhou em universidades de grande prestígio como a de Harvard, possui 13 doutorados honoris causa e teve participação em importantes processos judiciais. Um deles foi Lautsi vs. Itália no Tribunal Europeu de Direitos Humanos, onde a Itália e 21 países intervenientes foram assessorados na segunda instância por Weiler e venceram por 15 votos a favor e 2 votos contrários à argumentação do professor.
Em síntese, os juízes decidiram que países laicos e democráticos como a Itália e os 21 intervenientes podem exibir símbolos religiosos em locais públicos, exibi-los não viola a liberdade religiosa individual porque não há provas de que esses símbolos influenciem pessoas de outras religiões. O patrimônio religioso é parte da identidade cultural de um povo e é necessário haver tolerância religiosa de todos com todos.