Por Valdete Souto Severo, juíza do Trabalho da 4ª Região (RS), doutora em direito do trabalho USP
Juízes não devem fazer política partidária: está na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), que é de 1979. Período de Ditadura civil-militar; vigia o AI-5. A revisão da Loman, para adaptá-la aos tempos democráticos em que hoje deveríamos estar vivendo, sequer é cogitada. O Provimento 71 do CNJ, publicado no dia 13 proíbe juízes de participarem de "situações que evidenciem apoio público a candidato ou a partido político". Proíbe de expressarem suas convicções pessoais, determina que ajam "com reserva, cautela e discrição ao publicar seus pontos de vista nos perfis pessoais nas redes sociais". Estende isso aos servidores. Nenhuma dessas prescrições preocuparia, se vivêssemos na normalidade. O uso de termos genéricos em sua redação permite compreende-lo à luz da Constituição, que garante o direito ao livre pensamento como limite às possibilidades de patrulhamento ideológico. O Provimento, porém, possibilita controle ideológico e amordaçamento incompatível com o viver democrático. Determina que as corregedorias dos tribunais promovam "atividades de orientação e fiscalização, sem prejuízo da observância de outras diretrizes propostas pelos respectivos órgãos disciplinares".
2018 é ano de eleição presidencial e parlamentar. Quem ocupa a cadeira da presidência está sendo investigado por atos que em tese configuram crimes graves. O RJ está sob intervenção. Figuras públicas sugerem a tomada do poder pelos militares. Ativistas dos direitos humanos são assassinados. O STF relativizou a presunção de inocência e fulminou o direito de greve de servidores e empregados públicos. Há recessão; desemprego e aumento exponencial da violência.
Por que querem nos calar diante de tudo isso?
Juízes não devem fazer política partidária, mas também não devem assistir inertes a prisões seletivas e ilegais; ao desmanche dos direitos sociais; à quebra do pacto firmado em 1988.
A disseminação do medo, cujo objetivo imediato é paralisar, impedindo a resistência, pode ter efeito contrário: despertar a reação de quem ainda acredita na possibilidade de uma cultura democrática, plural, em que as opiniões possam ser manifestadas.
Afinal, estamos ou não em um Estado Democrático de Direito?