Para além da brincadeira, da diversão e da alegria, a festa mais popular do Brasil carrega historicamente a luta e a resistência do povo negro. Os Carnavais, que são manifestações múltiplas, plurais e complexas, se configuram como lugares possíveis de liberdade, legitimação e protagonismo para 54% da população brasileira, que é excluída do acesso a outros espaços, bens, serviços e demais oportunidades que o racismo estrutural nega. A festa da carne é memória, vida e continuidade para pretas e pretos. O Carnaval de rua da região central de Porto Alegre cresce a cada ano. Vale lembrar que até a primeira metade do século 20 essa região era povoada por negros e por seus Carnavais, até que fossem vítimas do processo eugenista de exclusão para bairros periféricos.
A lógica racista segrega da festa central a camada populacional autora dessas manifestações
THIAGO PIRAJIRA
Mestrando em Educação UFRGS Diretor do Grupo Pretagô de teatro
Em 2018, constat-se que a retomada desse movimento é composta em sua maioria por pessoas brancas, de classe média e que consomem a festa como entretenimento. No entanto, a lógica racista segrega da atual festa central a camada populacional autora dessas manifestações. Festejar é um direito de todos. Mas a atenção para fora dos umbigos privilegiados é um dever!
O Carnaval de escolas de samba passa por um terrível momento: mais uma vez a prefeitura golpeia as comunidades negando direitos básicos para a realização dos desfiles. As escolas assumem deveres básicos que o Estado não cumpre: dar oportunidades de emprego, de aprendizagem e de construção de subjetividades para crianças, jovens e adultos. Nelas, saberes e valores fundamentais à cidadania são transmitidos dos mais velhos aos mais novos, de onde emergem grandes profissionais nas mais diversas áreas. Que inclusive se tornam inspiração para o que na "bolha" central da Capital se faz.
Para a brincadeira ser consciente é importante também legitimar as comunidades, as escolas e os mestres que nos ensinaram e nos ensinam a construir os Carnavais! Como fazer isso? Indo aos ensaios das escolas e aos desfiles! É fundamental beber na fonte e não esquecer: os Carnavais no Brasil têm em suas bases a matriz tradicional africana.