Neste festival de falcatruas admitidas sem qualquer pudor pelos delatores da Odebrecht, nada causa tanta perplexidade quanto a confissão de compra de medidas provisórias e atos legislativos que favoreceram diretamente a empresa. MPs são atos do Executivo, um instrumento com força de lei utilizado pela Presidência da República para questões de urgência e relevância, que só se tornam definitivas depois da aprovação do Congresso. Se confirmadas as denúncias de que algumas decisões do Legislativo foram, na prática, compradas, o país ficará diante de um fato de impacto comparável às suspeitas de que algumas megaobras públicas foram concebidas acima de tudo para facilitar o pagamento de propina.
A gravidade da denúncia recomenda que tudo seja esclarecido de forma célere e aprofundada. O essencial, no caso, é discernir com clareza o que deve ser definido como lobby, uma atividade legítima, e o que de fato se constituiu no uso abusivo de dinheiro para motivar governantes a editar medidas provisórias e o Congresso a referendá-las, quando se limitavam a atender a interesses diretos dos corruptores. De forma debochada, algumas dessas iniciativas faziam parte de ações batizadas como "MP do Bem" e "Pacote de bondades".
Se ficar comprovado que medidas provisórias foram negociadas por altas somas, os envolvidos têm que ser identificados e punidos exemplarmente. A aprovação de MPs não pode ser fonte de recursos para campanhas eleitorais, propinas e caixa 2. A sociedade precisa se mostrar ainda mais vigilante em relação aos abusos com medidas provisórias, cobrando sempre transparência máxima quando esse recurso for utilizado.