Os gritos mais assustadores que ecoam na grande crise brasileira são os que pedem a "volta dos militares", o que implica pedir a volta da ditadura. Ou alguém pensa na candidatura de um militar da ativa nas próximas eleições?
Não tenho a menor dúvida de que existem generais democráticos e com espírito patriótico, mas duvido que algum deles vá fazer política nesse cenário conturbado. Vou ignorar quem grita pela ditadura com plena consciência do que aconteceu no Brasil entre 1964 e 1988. Esses não têm remédio, embora a loucura, em especial dos poderosos, deva ser sempre bem vigiada.
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Escrevo para os que gritam na perigosa corrente da inconsciência histórica, navegando na própria ignorância. Em Lisboa, no prédio que abrigou uma das prisões do regime salazarista, funciona o Museu do Aljube (do árabe "poço sem água"). Portugal enfrentou 48 longos anos de ditadura (1926 a 1974) que só terminou com a Revolução dos Cravos.
O que aconteceu nesses anos todos pode ser revisto e relembrado nos três pisos desse museu: celas minúsculas, julgamentos de fachada, sessões de tortura, deportação para as colônias e assassinatos. Em Santiago do Chile, o Museu da Memória e dos Direitos Humanos, em prédio imponente, cumpre a mesma função, mostrando o que fez Pinochet em seus anos de despotismo absoluto.
Quem vai a esses lugares não busca obras de arte, nem alimento para o espírito. Mesmo que busque, encontrará apenas o testemunho de décadas de gritos de dor e sussurros de esperança. Ouvi dizer que aquele sobrado amarelo na descida da rua Santo Antônio, em Porto Alegre – um centro clandestino de tortura conhecida como Dopinha entre 1964 e 1966 –, poderá ser transformado em sede de um memorial semelhante aos existentes em Lisboa e Santiago.
É importante que isso aconteça, e logo. Há milhões de jovens que querem, de coração, um Brasil melhor, mais honesto, mais justo, mas são levados por espertalhões a acreditar nos benefícios de uma intervenção inconstitucional que elimine a democracia. Eles precisam olhar pelas janelinhas das celas do Aljube ou do Dopinha e perceber que ali poderia estar um parente, um amigo, ou eles mesmos. Precisamos, urgente, de mais museus de gritos e sussurros.