O Brasil tem um novo governo e, como diria Millôr, um grande passado pela frente. Os contornos da agenda política começaram a se esboçar quando da posse interina no Palácio do Planalto. Cercado por parlamentares e novos ministros, Temer pareceu à vontade entre engomados e citados na Lava-Jato. Na oportunidade, anunciou, sob aplausos, o símbolo do novo governo com as palavras "Ordem e Progresso". Símbolos são importantes, como se sabe. A escolha pela inscrição positivista de nossa bandeira, expressão de um ideal do século 19, talvez ofereça uma referência sobre o tempo em que vivem nossas lideranças (o que vale, aliás, para direita e esquerda). Digo talvez, porque Temer não é um seguidor de Augusto Comte. Se fosse, não teria afagado a religião em seu discurso, gravado um vídeo com Marco Feliciano pedindo orações, nem recebido a bênção de Silas Malafaia no Palácio Jaburu, em agenda oficial. Ambos os pastores asseguram que Temer não é "satanista", uma pauta que se insere no âmago da Idade Média. Há noções distintas a respeito de ordem e progresso. A ordem democrática, por exemplo, pressupõe o dissenso, não o sagrado, e exige argumentos, não verdades reveladas. O espaço público não pode ser colonizado pela noção de verdade, porque isso seria o mesmo que impedir o debate e inviabilizar políticas públicas com base em evidências. Por não compreender o que isso significa, temos um ministro da Saúde que, diante da polêmica do uso da fosfoetanolamina, a chamada "pílula do câncer", declara que "a fé move montanhas".
Artigo
Símbolos
Jornalista e sociólogo
Marcos Rolim