A cada dia, uma nova bomba nuclear despenca sobre o Brasil, no clarão de um sol multiplicado por mil. Ao contrário das bombas sobre Hiroxima e Nagasaki, agora a luminosidade não nos torna cegos, mas nos faz enxergar cada vez mais.
O governo de Michel Temer não completou duas semanas e já mostra vícios, manias e doenças da decrepitude. Começou velho! Mas sem a sabedoria da senectude, em que os idosos (apesar de menos vitais) têm a lucidez que só se alcança com os anos. Em entrevista ao "Fantástico" da TV, domingo passado, o presidente interino portou-se como empedernido ancião, impermeável aos novos tempos em que o povo perdeu o medo de apontar corruptos e exigir justiça.
Indagado sobre o novo governo, com o ministro Romero Jucá, do Planejamento, envolvido na corrupção da Lava-Jato, Temer o defendeu: "Não há morte civil só por ser investigado".
E se virar réu? – indagou a entrevistadora:
– Aí vou examinar a situação! – disse, como se fosse normal que réu da Justiça planeje nosso presente e futuro!
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Temer foi benévolo também com o inefável Eduardo Cunha, do PMDB. Suspenso pelo Supremo Tribunal da presidência da Câmara de Deputados e já réu nas propinas da Petrobras, Cunha encarna o escândalo profundo da política. Chefia a "bancada evangélica" e continua a negar ter milionárias somas no exterior, ainda que os bancos suíços desmintam o que afirma com voz veemente de teatro ensaiado.
Mas Temer não o criticou nem analisou sua conduta, "para não interferir no Legislativo". E se Cunha renunciar? – insistiu a jornalista.
– Tanto faz. Para mim não altera nada! –, respondeu em forma definitiva o presidente provisório, como se estivesse em dívida por Cunha ter comandado o impeachment de Dilma.
Por que dar status de normalidade ao embuste e à corrupção?
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Em 2015, quando Dilma e Temer reiniciaram o governo da coalizão PT-PMDB com a base alugada, oito ministros respondiam a processo na Justiça. Um deles, Eliseu Padilha (hoje homem-forte do governo interino), livrou-se por estar processado na Justiça comum, quando tinha direito a foro privilegiado.
O governo Temer surgiu do impeachment pelo qual milhões de pessoas berraram nas ruas "contra a corrupção", mas nem por isto se rodeou de castas donzelas de convento. Além de Jucá (investigado na Lava-Jato e em desvio de verbas em Roraima) quatro ministros respondem a processo na Justiça.
O dos Transportes, Maurício Quintela, do PR, foi condenado por desviar R$ 133 milhões da merenda escolar em Alagoas. Recorreu e aguarda a decisão final em liberdade. Gilberto Kassab (ministro das Cidades com Dilma e, agora, de Ciência e Tecnologia), é réu em dois processos por improbidade administrativa quando prefeito de São Paulo. O dos Esportes, Leonardo Picciani, do PMDB, tem as contas eleitorais sob suspeita. O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, do PTB gaúcho, teve as contas rejeitadas pelo TRE, devido a doações de fonte escusa.
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Esqueçamos outras caduquices da esclerose política, como passar o INSS para o Ministério de Desenvolvimento Agrário e chamá-lo agora "de Desenvolvimento Social e Agrário". Ou o passaporte diplomático dado ao pastor Samuel Ferreira, da Assembleia de Deus, com o qual sai e entra a qualquer país sem revista de bagagem, mesmo investigado na Lava-Jato por "lavagem" da propina recebida por Eduardo Cunha.
Vamos aplaudir, porém, a decisão de Sartori de vetar o aumento da remuneração da Assembleia Legislativa, do Judiciário, Ministério Público e Tribunal de Contas, aprovada pelos deputados. Num Estado em crise, por que beneficiar quem melhor ganha no funcionalismo, quando os professores e os soldados da Brigada vivem à míngua, com salários indignos?
Nesse mar de esclerose, o governo de Sartori mandou os brigadianos investirem com fúria de cão hidrófobo contra as professoras e estudantes que, na Capital e em paz, pediam melhores condições de ensino.
Agora, os alunos ocupam as escolas e, com o professorado, fazem o contraponto para evitar a esclerose múltipla.