Quer acertar mais questões no Enem ano que vem? Na dúvida, assinale aquela resposta que acusa o capitalismo de ser feio, bobo e malvado. Ano após ano, a concepção das provas do Enem segue a mesma formulação que obriga a se concordar com uma visão de mundo na qual a sociedade deve se subordinar a um Estado onipresente, intervencionista e paternalista, em oposição à livre iniciativa.
Pois é graças ao Estado gigante sonhado pelos ideólogos do Enem que nos encontramos em petição de miséria. O governo foi à bancarrota porque gasta demais com serviços públicos de segunda linha, aposentadorias benevolentes e benesses variadas. Para financiar a gastança, precisa atrair o amaldiçoado capital privado elevando os juros a taxas obscenas, o que gera mais dívida e mais despesa. Nesse círculo do inferno em que fomos metidos pela irresponsabilidade fiscal, a classe média é penalizada duas vezes: a cada vez que abre a carteira e na contratação de serviços que deveriam ser públicos, como educação e saúde, quando não a segurança do vigilante.
A perversa primazia da lealdade partidária sobre a competência é uma das raízes destas distorções do modelo público brasileiro: enfileirar cargos em comissão e de confiança passou a ser o objetivo da chegada ao poder. Não cairá no Enem, mas para que tanta voracidade? Escolha as opções que pareçam mais verossímeis: para trabalhar pelo bem comum, para arrumar empregos para os cupinchas, para mover a máquina a seu favor nas próximas eleições ou para controlar o cofre com intenções petroleira?.
Para sairmos do atoleiro, não basta ajustar aqui e ali: será preciso zerar o odômetro do apadrinhamento e da estatização da vida nacional. Sou um caso raro de profissional que migrou voluntariamente do aparato público para a iniciativa privada. Podia ter tido um futuro tranquilo em uma estatal, mas aos 28 anos fui de mala e cuia para o setor privado por constatar que, nessa cultura pública originada nas capitanias hereditárias, o talento e o mérito são secundários: o que conta é o vínculo partidário que leva muitas vezes bons profissionais a, melancolicamente, ter de abanar bandeira na esquina para garantir o ganha-pão depois da eleição.
A emocionante entrevista do presidente da Flytour, Eloi D'Avila de Oliveira, a ZH no domingo passado, na qual ele narra como foi de menino de rua a megaempresário, comprova que o círculo só se romperá se uma cultura de empreendedorismo forte e Estado enxuto se sobrepuser aos conchavos e compadrios inerentes a uma nomenklatura que faz de tudo para preservar seu status quo. Quando o Enem trouxer questões nas quais criar empregos e gerar renda seja a alternativa certa, estaremos finalmente no rumo de uma sociedade com menos privilégios e mais desenvolvida.