O presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, fez uma série de afirmações polêmicas na última terça-feira (7). O republicano sugeriu que o Canadá deveria se fundir ao país, que não descarta a possibilidade de usar força militar para tomar o controle do Canal do Panamá e da Groenlândia e que pretende mudar o nome do Golfo do México. Para especialistas, os planos são improváveis.
— Podemos ter em mente que, pelo menos, 50% do que o futuro presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, fala não tem menor fundamento geopolítico no direito internacional. Isso nada mais é do que uma forma que ele encontra de se manter na mídia com essas declarações que não têm o menor sentido. A coisa é totalmente fora do padrão, chega a ser cômico — esclarece Charles Pennaforte, professor do curso de Relações Internacionais da Universidade Federal de Pelotas (UFPel).
A justificativa, segundo o político, envolve a importância das regiões para a economia e a segurança dos Estados Unidos. Luciana Wietchikoski, professora do curso de Relações Internacionais da Universidade do Vale do Sinos (Unisinos), pontua que essas afirmações fazem parte de uma estratégia de negociação já conhecida de Trump, bastante utilizada no seu primeiro mandato como presidente, entre 2016 e 2020.
— Politicamente, seria inviável (incorporar o Canadá e tomar o controle do Canal do Panamá e da Groenlândia). Diplomaticamente, também. Só que, militarmente, sim, seria possível. Os Estados Unidos são a principal potência mundial em termos militares. Então capacidade para isso, o país tem sim. Só que os custos políticos seriam inimagináveis — ressalta.
Incorporação do Canadá
A primeira fala que gerou repercussão foi sobre a possibilidade de anexar o Canadá ao território dos Estados Unidos, tornando o país o 51º Estado. Na ocasião, Trump afirmou que pode usar as forças norte-americanas contra os canadenses — impondo tarifas ou boicotando produtos do país. O político chegou a publicar uma foto nas redes sociais de como ficaria o mapa dos dois países juntos.
O primeiro-ministro canadense, Justin Trudeau, rejeitou a proposta de unificação. "Não há a menor chance de o Canadá se tornar parte dos Estados Unidos", escreveu no X (antigo Twitter). Luciana defende que os dois países têm uma relação benéfica no formato atual:
— Não considero que essa unificação seja viável. Só que a importância do Canadá é extremamente relevante em termos comerciais, é o que a gente chama de interdependência econômica. Muito do comércio canadense depende dos Estados Unidos. Só que, por outro lado, os Estados Unidos também dependem do Canadá, como, por exemplo, na questão de recursos energéticos.
Para Trump, os dois países funcionariam melhor financeiramente se fossem um só. Os especialistas defendem que, neste sentido, elaborar novos acordos, favoráveis para ambos, poderia ser uma solução mais benéfica.
Administração do Canal do Panamá
O Canal do Panamá foi construído pelos Estados Unidos e inaugurado em 1914. Passou para as mãos do país centro-americano em 31 de dezembro de 1999, conforme os tratados assinados em 1977 pelo então presidente dos EUA Jimmy Carter e pelo líder nacionalista panamenho Omar Torrijos.
Trump já havia dito em várias ocasiões que gostaria de recuperar o Canal do Panamá se não fossem reduzidos os pedágios para os navios norte-americanos. Na terça-feira, voltou a criticar o acordo assinado na década de 1970, e sinalizou que não descarta a possibilidade de uma ação militar, caso considere necessário. Luciana afirma que a região é de suma importância econômica para os Estados Unidos.
— Para os Estados Unidos é extremamente relevante, é fundamental, para a própria redução dos custos marítimos, de não precisar fazer toda a volta na América do Sul até chegar a um oceano ou outro, principalmente do Pacífico para o Atlântico, e para a questão das importações e exportações para outras regiões. O Trump já dá, antes mesmo de assumir esse governo, indícios de como serão as negociações em relação aos interesses dos Estados Unidos de conseguir melhores taxas — explica a professora.
Em dezembro do ano passado, cerca de uma centena de manifestantes se reuniu em frente à embaixada dos EUA no Panamá para repudiar a ameaça de Donald Trump.
Controle da Groenlândia
Geograficamente situada na América do Norte, a Groenlândia é parte do Reino da Dinamarca desde 1953. Em 2009, o país europeu autorizou a região a ter um governo próprio e autônomo. O interesse do político no espaço vem desde o primeiro mandato e é baseado na questão da segurança dos Estados Unidos, uma vez que a ilha é considerada um território estratégico.
Logo após o Natal, Trump disse que "pelo bem da segurança nacional e da liberdade em todo o mundo, os Estados Unidos da América acreditam que a propriedade e o controle da Groenlândia são uma necessidade absoluta". Nesta terça-feira (7), o republicano reforçou a opinião. Além disso, seu filho, Donald Trump Jr., chegou à Groenlândia para uma visita privada no mesmo dia.
— Eu acredito que estão atentos, já há bastante tempo, à força da Rússia no Ártico. A Rússia rearticulou toda a sua estratégia geopolítica para o Ártico. Eles estão vendo isso como uma problemática. Só que, do ponto de vista geopolítico, os Estados Unidos não têm uma área de influência sobre o Ártico como a Rússia tem — pontua Pennaforte. — Então, ficaria aí uma forma de controlar uma parte do que seria o Ártico Geopolítico. Existiriam outras maneiras de fazer isso, como um acordo com o Canadá, um acordo com a Dinamarca, ter uma estratégia definida para o Ártico, como tem a Rússia.
"Golfo da América"
Na terça-feira, o presidente eleito também afirmou que irá renomear o Golfo do México, considerado o maior golfo do mundo, para "Golfo da América". Para ele, além do novo nome soar mais bonito, também seria apropriado porque os Estados Unidos são responsáveis por todo o trabalho na Região.
Ele não especificou como pretende realizar a alteração. Também não ficou claro se a medida seria uma forma de buscar controle na região. Vale ressaltar que, nos Estados Unidos, o termo "América" é utilizado para designar apenas o país, e não o continente americano de forma completa.
— Esses nomes são geográficos. Eles podem chamar do jeito que eles quiserem para a plateia interna, para o público deles. Os Estados Unidos podem votar para a mudança de nome. Só que para a comunidade internacional, vai continuar sendo o Golfo do México em função das características geográficas da região — afirma o professor da UFPel.
Marjorie Taylor Greene, deputada de Georgia e apoiadora de Trump, confirmou no X que irá apresentar uma legislação o mais rápido possível para mudar oficialmente o nome do Golfo do México.