Os estudantes de Bangladesh estão determinados a continuar com seus protestos, que deixaram 155 mortos, e exigem agora a renúncia da primeira-ministra, Sheikh Hasina, apesar de a Justiça ter decidido, neste domingo (21), flexibilizar o sistema de cotas nos empregos públicos que desencadeou as manifestações.
O Supremo Tribunal de Bangladesh flexibilizou o sistema que permitia a certos setores um acesso mais fácil ao emprego público, embora não tenha anulado a norma.
"O Supremo Tribunal disse que o veredicto do Tribunal Superior era ilegal", disse o procurador-geral A. M. Amin Uddin à AFP, referindo-se a uma decisão anterior que reintroduziu o sistema de cotas.
A norma, que permite aos filhos dos veteranos de guerra um acesso mais fácil ao emprego público, desencadeou uma onda de distúrbios que já deixaram ao menos 155 mortos neste país asiático de 171 milhões de habitantes.
O Supremo Tribunal deveria se pronunciar no mês que vem sobre a legalidade do sistema, mas antecipou seu veredicto devido às cenas de violência que abalam a nação e ao desafio que representam para a primeira-ministra Sheikh Hasina, no poder há 15 anos.
Os soldados foram enviados para as cidades devido à incapacidade da polícia em restaurar a ordem. Além disso, as conexões à Internet estão limitadas desde quinta-feira, restringindo o fluxo de informações para o exterior.
A decisão do alto tribunal reduziu o número de empregos reservados de 56% para 7%, mas não conseguiu satisfazer as exigências dos manifestantes.
Shah Monjurul Hoque, advogado envolvido no caso, disse à AFP que o tribunal também pediu aos estudantes que "voltassem às aulas".
O grupo "Estudantes Contra a Discriminação" afirmou que os protestos não vão parar "até que o governo tome uma decisão que leve em conta as nossas reivindicações".
A polícia prendeu vários membros do Partido Nacionalista de Bangladesh (BNP, na sigla em inglês), o principal da oposição, e do "Estudantes Contra a Discriminação".
- 'Renúncia do governo' -
"Isso não se trata mais dos direitos dos estudantes", disse à AFP o empresário Hasibul Sheikh, de 24 anos, em um protesto no sábado na capital Daca, desafiando o toque recolher obrigatório a nível nacional.
"Nossa exigência agora é um ponto, é a renúncia do governo", disse.
Com a decisão do Supremo Tribunal, 5% dos empregos no serviço público - e não mais 30% - continuarão reservados aos filhos dos veteranos da Guerra da Independência, e 2% para outras categorias.
Os 93% restantes seriam decididos por mérito, segundo o tribunal.
Quase 18 milhões de jovens estão desempregados em Bangladesh, segundo dados do governo. A reintrodução do sistema de cotas incomodou profundamente essa parte da população, que enfrenta uma grave crise de emprego.
Segundo os críticos, o sistema é também uma forma de colocar pessoas próximas da primeira-ministra em cargos públicos.
Os opositores também acusaram o Executivo de influenciar o Judiciário, embora Hasina tivesse sugerido esta semana que o tribunal decidiria a favor das reivindicações dos estudantes.
Os estudantes apelaram à abolição total do sistema e à introdução de outras cotas para mulheres e distritos específicos no país.
Sheikh Hasina, de 76 anos, lidera o país desde 2009 e conquistou seu quarto mandato consecutivo em janeiro, em eleições que não tiveram uma oposição de fato.
Grupos de direitos humanos acusam seu governo de usar indevidamente as instituições estatais para se consolidar no poder e esmagar a oposição, inclusive através de execuções extrajudiciais.
Por sua vez, o ministro do Interior de Bangladesh, Asaduzzaman Khan, disse à AFP que o toque de recolher imposto no sábado permanecerá em vigor "até que a situação melhore", enquanto alguns manifestantes incendiaram edifícios do governo e delegacias de polícia.
Índia e Nepal anunciaram neste domingo que estão fornecendo ajuda a seus cidadãos para que retornem a seus países, e os Estados Unidos desaconselharam viagens para Bangladesh, ao mesmo tempo em que anunciaram a repatriação de alguns diplomatas e de suas famílias.
* AFP