Dezenas de milhares de pessoas marcharam nesta segunda-feira (20) no Uruguai para exigir verdade e justiça para os desaparecidos durante a ditadura (1973-1985), um clamor ao qual se somaram, nas redes sociais, personalidades como o jogador de futebol Luis Suárez.
Atrás de uma faixa com os dizeres "Eles sabem onde estão! Exigimos respostas. Terrorismo de Estado nunca mais!", a 29ª Marcha do Silêncio percorreu cerca de 20 quadras do centro de Montevidéu, em um ato que foi replicado em várias cidades do país.
Nesta noite fria, não havia bandeiras nem símbolos partidários, apenas cartazes com fotos dos quase 200 desaparecidos. O silêncio absoluto foi rompido quando os nomes de todos eles foram lidos seguidos da exclamação "Presente!", antes que a manifestação se encerrasse com o hino nacional.
Registros oficiais contabilizam 197 pessoas desaparecidas por ações atribuídas ao Estado uruguaio entre 1968 e 1985, período que inclui a ditadura civil-militar, a grande maioria delas detida na Argentina no contexto do Plano Condor de colaboração entre os regimes vizinhos.
"As Forças Armadas, que sequestraram, torturaram, assassinaram e sumiram com nossos familiares, sabem muito bem o que fizeram com eles e elas", disse Alba González, porta-voz da associação de Mães e Familiares de Uruguaios Detidos Desaparecidos, ao convocar a mobilização.
"Contudo, sustentados por algum ódio incompreensível, insistem em manter a verdade sequestrada", acrescentou a mãe de Rafael Lezama González, desaparecido em Buenos Aires em outubro de 1976, exigindo "vontade política" para finalmente saber o paradeiro de seus entes queridos.
A Marcha do Silêncio é convocada a cada 20 de maio porque, nesse dia em 1976, foram assassinados em Buenos Aires os legisladores uruguaios Zelmar Michelini e Héctor Gutiérrez Ruiz e os membros da guerrilha tupamara Rosario Barredo e William Whitelaw.
Em um comunicado, a Instituição Nacional de Direitos Humanos e Defensoria do Povo (INDDHH), que apoiou e aderiu à concentração, disse que esperam "novidades em breve" sobre a identidade dos restos de uma mulher encontrados em 6 de junho de 2023 no Batalhão de Infantaria 14 e atribuídos a uma detida desaparecida.
O ex-presidente uruguaio José Mujica (2010-2015), que integrou a luta armada contra governos democráticos nos anos 1960 e 1970 e passou 12 anos preso, a maior parte durante a ditadura, esteve presente, mas não caminhou devido ao tratamento de radioterapia contra o câncer de esôfago do qual padece.
"Me lembro de ter dito: 'Isto vai terminar no dia em que todos nós desaparecermos'. Me enganei. Porque depois andei pela Espanha e encontrei gente de novas gerações remexendo ossos", declarou Mujica aos jornalistas, em alusão às vítimas da Guerra Civil Espanhola (1936-1939) e da ditadura de Francisco Franco, que durou até 1975.
"Há coisas que os seres humanos não esquecem mais", frisou.
Segundo um levantamento recente do centro de pesquisa Usina de Percepção Cidadã, 56% da população no Uruguai acredita que as ações do Estado para encontrar os desaparecidos foram insuficientes.
* AFP