O aguardado conselho presidencial de transição, encarregado de preencher o vácuo institucional no Haiti e restaurar a ordem no país foi finalmente instalado nesta sexta-feira (12) na nação caribenha, abalada há semanas por uma explosão de violência.
Um decreto publicado no jornal oficial do Haiti, "Le Moniteur", anunciou a formação do conselho, um mês depois de o primeiro-ministro Ariel Henry anunciar sua demissão em meio a uma onda de ataques de gangues criminosas na capital, Porto Príncipe.
"O mandato do conselho presidencial de transição termina, no mais tardar, em 7 de fevereiro de 2026", diz o decreto, que especifica que seus membros devem nomear "rapidamente" um primeiro-ministro e um governo "inclusivo".
O conselho ainda não está formalmente a cargo do país. Henry "vai apresentar a demissão de seu governo após a nomeação de um novo primeiro-ministro", diz o documento.
O anúncio, atrasado durante semanas por disputas políticas, é um passo esperançoso nos esforços por estabelecer as condições para a mobilização de uma força policial internacional aprovada pela ONU.
Também representa um primeiro passo para a realização de eleições presidenciais no início de 2026. A última vez que o Haiti foi às urnas foi em 2016 e o país está sem presidente desde o assassinato de Jovenel Moise, em 2021.
"O estabelecimento do Conselho de nove membros, de base ampla e politicamente inclusivo, assinala a possibilidade de um novo começo para o Haiti", reagiu a Comunidade do Caribe (Caricom) nesta sexta-feira.
No entanto, ainda há dúvidas sobre se o governo interino apoiado pelos Estados Unidos será capaz de impor sua autoridade sobre as gangues que controlam grande parte de Porto Príncipe.
- Violência das gangues -
O empobrecido país caribenho é assolado há décadas por uma instabilidade crônica, catástrofes naturais e a violência de quadrilhas armadas.
Desde o fim de fevereiro, poderosas gangues haitianas se uniram para fazer ataques coordenados contra delegacias, prisões, o aeroporto e o porto, exigindo a renúncia de Henry.
Nomeado poucos dias antes do assassinato de Moise, Henry foi duramente questionado e não conseguiu voltar ao seu país após uma viagem ao Quênia.
Em 11 de março, no mesmo dia de uma reunião entre haitianos e várias organizações e países como os Estados Unidos, ele anunciou que renunciaria para dar lugar a um conselho presidencial de transição.
Formado por sete membros com direito de voto, selecionados em todo o espectro político do Haiti e dois observadores sem direito a voto, o conselho de transição tem como objetivo principal nomear um novo primeiro-ministro e preparar o país para a realização de eleições.
Este órgão surgiu após semanas de negociações difíceis. O secretário-geral da ONU, António Guterres, interveio e instou às partes interessadas deixar de lado suas divergências.
O poderoso líder de gangue Jimmy "Barbecue" Chérizier, cuja aliança G9 de mil membros controla partes de Porto Príncipe, foi um dos excluídos do novo governo devido às condições que proíbem a participação de quem é alvo de sanções da ONU.
- 'Prisão a céu aberto' -
A nova autoridade também enfrenta o desafio imediato de ajudar os cidadãos haitianos a escapar da pobreza esmagadora, agravada pela insegurança.
Gédéon Jean, diretor da ONG Centro de Análise e Pesquisa dos Direitos Humanos, considerou que a criação deste órgão "é um passo importante", mas advertiu que "esta etapa não é um fim em si mesmo".
"Será preciso criar as condições de segurança necessárias para que o conselho possa trabalhar e, sobretudo, para proteger a população, que é a prioridade".
"Sem o restabelecimento da segurança, os membros do conselho não poderão exercer suas funções", insistiu.
Segundo as Nações Unidas, de uma população de 11,6 milhões de habitantes, cerca de 360 mil haitianos são deslocados internos, muitos dos quais fugiram da violência das gangues.
Porto Príncipe é "uma prisão a céu aberto, uma cidade completamente isolada" em um país onde "não há mais governo, não há Estado", explicou à AFP Sarah Chateau, encarregada do programa Haiti para a organização Médicos sem Fronteiras (MSF).
Os três milhões de habitantes de Porto Príncipe e periferia estão "presos", "com tiros permanentemente", segundo Chateau.
Cerca de cinco milhões de pessoas, quase metade da população, estão em situação de "insegurança alimentar aguda", segundo especialistas da ONU.
Com o aeroporto e o porto paralisados pelo cerco das gangues, os haitianos precisam enfrentar escassez de comida, medicamentos e outros produtos básicos.
* AFP