O ultradireitista Javier Milei é o grande vencedor das Primárias, Abertas, Simultâneas e Obrigatórias (PASO) , que são um termômetro para a disputa presidencial da Argentina. O economista que surgiu com uma terceira força política virou o jogo e saiu como protagonista da votação desse domingo (13). Com 97,42% dos votos apurados, Javier Milei tem 30,04% dos votos À frente da coalizão de centro-direita Juntos por el Cambio (28,27%) e da coalizão da esquerda que governa o país Unión por la Pátria (27,27%).
As prévias definem as chapas que vão concorrer na eleição presidencial de outubro. Milei concorre sozinho dentro da sua coalizão, mas tanto o governismo como a oposição tem mais de um candidato. Além de liderar o voto por chapas, Milei foi o candidato mais votado, com 7 milhões de votos.
Em segundo, com 5 milhões de votos, está Sérgio Massa, o todo-poderoso ministro da Economia da Argentina, apoiado pelo presidente do país, Alberto Fernández, e pela vice, Cristina Kirchner.
Apesar do segundo lugar de Massa, a coalizão governista ficou em terceiro lugar no voto por chapas, no pior resultado do peronismo em 12 anos de eleições primárias. Desde que o pleito foi implementado, em 2011, as alianças peronistas sempre acumularam as maiores porcentagens de votos.
Patricia Bullrich, candidata da centro-direita e esperança dos conservadores tradicionais argentinos para derrotar a esquerda, foi a terceira candidata mais votada, com 4 milhões de votos. Na disputa pela vaga interna do Juntos por el Cambio, a candidata linha-dura garante uma vaga no primeiro turno de outubro, registrando 17% contra 10,7% de Horacio Larreta, prefeito de Buenos Aires.
Estes três candidatos medirão forças nas eleições gerais de 22 de outubro, com um possível segundo turno em 19 de novembro.
Milei, um leão contra a casta
Com os cabelos desalinhados e discurso agressivo contra o que chama de "a casta política", Milei se tornou nestas primárias o fenômeno que sacudiu o status quo.
"A casta tem medo", "Viva a liberdade, c...!", clamou em seus comícios este economista de 52 anos, um deputado libertário e ultradireitista que propõe eliminar o Banco Central, permitir o livre porte de armas e proibir o aborto.
"Não vim aqui para guiar cordeiros, vim para despertar leões", foi seu lema.
Após ter sido eleito deputado em 2021, Milei rifou seu salário, em um gesto de desprezo com os benefícios dos políticos. Suas críticas à intervenção estatal tiveram eco nas regiões mais desfavorecidas da Argentina, onde a pobreza aumenta.
E as críticas de ex-colaboradores, que denunciaram que ele pedia pagamento em dólares para inscrever candidaturas não parece ter arranhado sua popularidade crescente, especialmente entre os homens jovens, chateados ou indignados com a política tradicional.
Milei publicou vários livros e também foi acusado de plagiar parágrafos inteiros. Além disso, teve um programa de rádio na internet, chamado "Demoliendo mitos".
Solteiro e sem filhos, o amor por seus cães da raça mastim e a relação muito estreita com a irmã, Karina, formam, em suas próprias palavras, seu círculo afetivo mais próximo.
Massa, a habilidade política
Advogado de 51 anos, Sergio Massa assumiu o ministério da Economia há um ano, em um dos piores momentos da prolongada crise argentina. Sorridente e elegante, tem a habilidade de apresentar as dificuldades como conquistas, ao menos entre seus apoiadores.
– Veio pôr ordem no ministério. Foi uma tarefa hercúlea – disse à AFP o líder peronista Jorge Ferraresi.
Apesar da inflação (115% em um ano) e da pobreza (40%) estarem em picos históricos, a vice-presidente, Cristina Kirchner, o elogia:
— Sergio, você assumiu em um momento muito difícil, muito complexo. Você não se encolheu, foi para frente e isso sempre é bom" — a dirigente da coalizão governista Unión por la Patria (União pela Pátria).
Ambicioso, Massa fez e desfez alianças políticas. Em 2013, criou o Frente Renovador (Frente Renovadora), um partido de centro como alternativa a Kirchner, de quem foi chefe de gabinete entre 2008 e 2009.
— Tem um ponto forte: é uma pessoa muito próxima do círculo de poder da política, da mídia e dos empresários — descreveu a cientista política Paola Zubán.
Filho de imigrantes italianos, Massa cresceu na periferia de Buenos Aires. É casado e tem dois filhos.
Bullrich, a linha-dura
Com 67 anos e envolvida na política desde a adolescência, quando militou na Juventude Peronista nos turbulentos anos 1970, em plena atividade da guerrilha Montoneros, Patricia Bullrich se apresenta como linha-dura, sem meias palavas em um país em crise. "É tudo ou nada", diz em suas mensagens publicitárias.
A história de sua família se entrelaça com a da Argentina. Seu bisavô, Honorio Pueyrredón, foi um dirigente radical renomado (social-democrata). A família Bullrich foi proprietária da mais importante casa de leilões de gado de Buenos Aires no século XIX. Seu cunhado, Rodolfo Galimberti, foi um líder importante dos Montoneros. E sua prima, Fabiana Cantilo, é um nome de destaque do rock nacional.
Foi ministra de Segurança no governo Macri (2015-2019) e ministra do Trabalho no de Fernando de la Rúa (1999-2001). Atual presidente do partido PRO, cultivou a imagem de mulher decidida e intransigente.
— A coragem, a decisão e a firmeza a caracterizam. Tem grande capacidade de avaliação política — disse à AFP Fernando Iglesias, dirigente muito próximo dela.
Bullrich tem um filho, Francisco Langieri, nascido em 1979, quando voltou à Argentina depois de passar alguns anos no exílio com seu companheiro da época, Marcelo "Pancho" Langieri. Seu marido atual é o advogado Guillermo Yanco.
Votação tumultuada em Buenos Aires
A demora na definição dos resultados é explicada, em partes, pela confusão em Buenos Aires. A cidade adotou um sistema híbrido: a votação nacional dos presidenciáveis seguiu a tradição do voto de papel enquanto a urna eletrônica foi adotada em paralelo para a eleição local. Esse último foi marcado por problemas.
O mau funcionamento das urnas causou longas filas e atrasos. Assim como muitos argentinos, a pré-candidata à presidência Patricia Bullrich teve dificuldades. Ela contou a jornalistas que a urna mostrava candidatos diferentes dos escolhidos e precisou ser substituída. Só assim, a candidata conseguiu votar depois de sete tentativas e 12 minutos.
Alguns pontos de votação em Buenos Aires prorrogaram o horário de funcionamento para atender todas as pessoas. Apesar dos problemas, a participação foi de 69%, acima do registrado na prévia das eleições legislativas de 2021.