Milhares de pessoas protestaram nesta terça-feira (15) em Cabul e outras cidades do Afeganistão contra a decisão dos Estados Unidos de confiscar US$ 3,5 bilhões de reservas do Banco Central afegão para compensar as vítimas dos ataques de 11 de setembro.
"Morte à América" e "Morte a Joe Biden" eram algumas das palavras de ordem entoadas pelos manifestantes.
"Se alguém merece compensação, são os afegãos", declarou Mir Afghan Safi, presidente da associação afegã de corretores de câmbio, que participou do protestos em Cabul.
Ele afirmou que enquanto os Estados Unidos sofreram com a queda das Torres Gêmeas em Nova York no ataque de 11 de setembro de 2001, todo o seu país sofreu com a guerra. "Nosso país inteiro foi destruído", afirmou.
O Talibã, que está no poder há seis meses, ameaçou na segunda-feira "reconsiderar" sua política em relação aos Estados Unidos se o país não liberar os fundos afegãos congelados.
"Os ataques de 11 de setembro não têm nada a ver com o Afeganistão", disse seu vice-porta-voz, Inamullah Samangani.
O Talibã - que diz querer boas relações com os Estados Unidos após a retirada das forças americanas e da Otan - chamou o confisco de "roubo".
Na sexta-feira, o presidente dos EUA, Joe Biden, assinou uma ordem executiva para confiscar US$ 7 bilhões que o Banco Central do Afeganistão possui no sistema financeiro dos EUA.
Biden quer que metade desse valor seja reservado às indenizações de parentes das vítimas dos ataques de 11 de setembro e a outra metade para ajuda humanitária no Afeganistão, mas esses fundos serão distribuídos evitando cair nas mãos do Talibã.
Mas a resposta dos islamitas à decisão americana gerou apoio até mesmo entre os opositores do retorno dos fundamentalistas ao poder, inclusive entre dezenas de milhares de pessoas que fugiram do país.
Não há indicação sobre quais medidas o Talibã pode tomar, mas uma possibilidade é que reverta sua promessa de deixar os milhares de afegãos que trabalharam para os Estados Unidos e outros países ocidentais se refugiarem no exterior.
- Restrições dos direitos das mulheres -
Os protestos coincidem com a decisão do Talibã de declarar esta terça-feira feriado pelo 33º aniversário da retirada das tropas soviéticas.
O Exército Vermelho que invadiu o país na véspera do Natal de 1979 retirou suas últimas tropas quase uma década depois, em 15 de fevereiro de 1989, depois de perder quase 15.000 soldados nos combates contra os combatentes islamitas apoiados pelo Ocidente.
A saída precipitou uma guerra civil na qual surgiu o Talibã, que deteve o poder entre 1996 e 2001.
Esses quarenta anos de conflito e o retorno ao poder do Talibã em 2021 provocaram uma grave crise humanitária. A ONU afirma que mais da metade dos 38 milhões de afegãos corre o risco de fome.
O Talibã restringiu os direitos das mulheres, incluindo o acesso à educação. Também impôs a obrigação de estarem acompanhadas por um homem da família em viagens longas e que as excluíram do serviço público.
"A retirada dos soviéticos não foi um sucesso, foi o início da crise", disse o analista afegão Ahmad Saeedi.
"O Afeganistão encara novamente desafios crescentes que o levam à beira do abismo", disse ele à AFP, observando que o Talibã perdeu muito tempo nos últimos seis meses.
Para Hayatula Ahmadzai, um veterano da guerra contra os soviéticos de 74 anos que participou da manifestação de hoje, o Talibã é uma consequência direta da ocupação soviética. A situação "acabou em caos, deu origem ao Talibã", disse ele.
* AFP