Os talibãs voltaram a adiar, neste sábado (4), a apresentação de seu Executivo, cuja composição poderia dar pistas sobre como serão os próximos anos no Afeganistão, em meio à resistência no vale Vale do Panshir.
Embora quase três semanas tenham-se passado desde que o Talibã recuperou o poder, duas fontes do movimento islâmico disseram à AFP que o esperado anúncio do novo governo será adiado pela segunda uma vez.
Originalmente, o gabinete ministerial talibã seria divulgado na sexta-feira (3), o que foi adiado para hoje.
Uma explicação para este atraso pode ser a situação em Panshir, um dos últimos focos de oposição armada ao novo regime. Um antigo reduto antitalibã, este vale fica a cerca de 80 quilômetros ao norte da capital e é de difícil acesso.
Desde segunda-feira (30), quando as últimas tropas americanas deixaram o país, o vale é palco de combates entre os talibãs e a Frente Nacional de Resistência (FNR).
Enquanto isso, em Cabul, rajadas de arma de fogo ecoaram na sexta-feira à noite (3), para celebrar a vitória do movimento islâmico em Panshir, após rumores do sucesso talibã. O grupo não fez, porém, qualquer anúncio oficial a esse respeito. Um morador de Panshir, com quem a AFP falou por telefone, afirmou que esses anúncios eram falsos.
- "Resistência continua" -
Segundo os serviços de emergência da capital, duas pessoas morreram, e outras 20 foram feridas por esses disparos "de celebração". Este episódio levou o principal porta-voz do Talibã, Zabihullah Mujahid, a pedir aos seus apoiadores, no Twitter, que parem de "atirar para o alto" e, "em vez disso, [deem] graças a Deus".
Refugiado no Vale do Panshir, o ex-vice-presidente Amrullah Saleh divulgou uma mensagem de vídeo ontem à noite, alertando que uma "situação muito difícil" está acontecendo, mas que "a resistência continua e continuará".
De acordo com Ahmad Massud, que lidera a resistência no vale, os talibãs ofereceram à FNR dois cargos no futuro governo.
Mas, "como pedíamos um futuro melhor para o Afeganistão, nem sequer consideramos" a oferta, disse na quarta-feira (1/9) o filho do comandante Ahmed Shah Massud, assassinado em 2001 pela Al-Qaeda.
Para Massud, os talibãs "escolheram o caminho de guerra".
Desde sua volta ao poder, os talibãs tentam transmitir uma imagem de moderação. Nesse sentido, prometeram formar um governo "inclusivo" e, nas últimas semanas, multiplicaram seus contatos com personalidades afegãs que se opõem a eles. Entre elas, estão o ex-presidente Hamid Karzai e o ex-vice-presidente Abdullah Abdullah.
Na sexta-feira (3), vários países voltaram a afirmar que vão julgar o novo governo por suas ações, e não por suas palavras.
- Governo 'realmente inclusivo'
O presidente russo, Vladimir Putin, disse esperar que os talibãs se comportem de maneira "civilizada", enquanto a China pediu-lhes que "rompam" definitivamente com grupos "terroristas".
O secretário de Estado americano, Antony Blinken, que visitará o Catar entre segunda e quarta-feira, manifestou, por sua vez, que espera que o governo seja "realmente inclusivo" com "não talibãs" representativos "das diferentes comunidades e dos diferentes interesses do Afeganistão".
Embora tenham prometido assegurar os direitos das mulheres, o Talibã já deu a entender que o gênero não estará representado em seu futuro gabinete. Várias ativistas foram às ruas em Herat (oeste), na quinta-feira, e na capital, na sexta, em protesto.
Para além das questões de segurança, a questão agora é como os talibãs conseguirão endireitar a economia do país, que se encontra em um estado lamentável após quatro décadas de conflito.
"O Afeganistão enfrenta uma catástrofe humanitária iminente", alertou a ONU na sexta-feira, que realizará uma reunião em 13 de setembro para aumentar a ajuda humanitária destinada ao país.
O Catar anunciou o envio, neste sábado (4), de 15 toneladas de ajuda humanitária procedente do mundo todo para o Afeganistão e disse que os voos continuarão "nos próximos dias".
Os "voos internacionais" estarão "operacionais em breve", disse o embaixador do Catar no Afeganistão, Saeed bin Mubarak Al-Khayarin, à rede Al-Jazeera.
O radar, a torre de controle e a pista foram reparados, e a segurança, garantida, dentro e ao redor do aeroporto de Cabul, acrescentou o embaixador catariano.
* AFP