A Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte-IDH) prevê começar a tratar nesta quarta-feira o caso de uma salvadorenha condenada a 30 anos de prisão por homicídio agravado por, segundo sua família, sofrer um aborto espontâneo.
"O que eu quero pedir (é) que se faça justiça para a minha família e a minha mãe. Que não continuem fazendo o que fizeram com a minha mãe", disse por videoconferência Jesús, de 21 anos, que ficou órfão juntamente com seu irmão caçula, Tomás, quando a mãe deles morreu enquanto cumpria pena.
O caso confronta a família de Manuela, falecida na prisão em 2010, e o Estado de El Salvador. A sentença pode levar um ano para ser conhecida.
A diretora para a América Latina do Centro de Direitos Reprodutivos, Catalina Martínez, destaca "a importância" do caso Manuela, pois é o primeiro a chegar a esta corte.
Queremos que se "reconheça que negar serviços de saúde reprodutiva e criminalizar mulheres por eventos obstétricos constitui violência", destacou.
"Estamos pedindo à Corte que estabeleça medidas (de reparação) nas quais o Estado de El Salvador cumpra com diferentes responsabilidades", como restabelecer a "dignidade" de Manuela em um ato público, disse Morena Herrera, coordenadora do Grupo Cidadania para a Descriminalização do Aborto, Terapêutico, Ético e Eugenésico (ACDATEE).
Manuela não sabia ler, nem escrever e morava em uma zona rural com poucos recursos. Ela sofria de "câncer linfático" não diagnosticado que, segundo García, da Coletiva Feminista, provocou-lhe uma emergência obstétrica.
"Nas consultas médicas só lhe davam comprimidos para aliviar a dor", destacou García.
Em fevereiro de 2008, após sofrer fortes dores pélvica e abdominal, Manuela foi a uma latrina que ficava a alguns metros de sua casa.
"Manuela sabia de sua gravidez, mas não que naquele momento enfrentava uma emergência obstétrica: expulsou o feto e desmaiou, tratou-se de um parto precipitado por causa de sua saúde precária", assegurou em um comunicado o Centro de Direitos Reprodutivos, uma ONG sediada nos Estados Unidos.
Manuela foi condenada a 30 anos de prisão e em 30 de abril de 2010, aos 33 anos, morreu algemada a uma cama no setor de detentos do hospital nacional Rosales, onde fazia tratamento contra o câncer linfático.
O código penal salvadorenho proíbe o aborto em todos os casos e prevê penas de até 8 anos de prisão. No entanto, promotores e juízes tipificam os casos de aborto, inclusive os espontâneos, como "homicídio agravado", passível de punição com penas de até 50 anos de prisão.
* AFP