Dois mortos, mais de 700 detidos e uma onda de incêndios e saques. Diante de protestos violentos, a capital do Chile, Santiago, amanheceu com praticamente todo o comércio fechado, voos suspensos e cancelados no aeroporto, quase nenhum público e patrulhada por militares — o que não acontecia desde o final da ditadura do general Augusto Pinochet, em 1990. As autoridades decretaram, neste domingo (20), toque de recolher pelo segundo dia consecutivo. A medida passou a valer a partir das 19h.
O centro de Santiago virou um cenário de destruição: semáforos no chão, ônibus queimados, lojas saqueadas e milhares de destroços nas ruas. O presidente chileno, Sebastián Piñera, decretou estado de emergência e toque recolher em três regiões, que resultou na presença de quase 10 mil membros das Forças Armadas nas ruas da capital.
Durante a madrugada, duas pessoas morreram em um grande incêndio após o saque de um supermercado da rede Líder, um dos muitos alvos de ataques dos manifestantes nas últimas horas. Inicialmente as autoridades haviam anunciado três vítimas fatais no incêndio do estabelecimento de Santiago, mas o balanço oficial divulgado neste domingo pelo ministro do Interior e Segurança, Andrés Chadwick, modificou o número.
Segundo ele, uma terceira pessoa ficou gravemente ferida, com 75% do corpo queimado. Chadwick informou ainda que durante a madrugada duas pessoas foram feridas a tiros após um incidente com uma patrulha policial entre Puente Alto e La Pintana.
Os manifestantes também atacaram ônibus e estações do metrô. De acordo com o governo, 78 estações foram atingidas e algumas ficaram completamente destruídas. O prejuízo ao metrô de Santiago supera 300 milhões de dólares e algumas estações e linhas demorarão meses para voltar a funcionar, afirmou o presidente da companhia estatal, Louis de Grange. Eixo do transporte público da capital chilena, com quase três milhões de passageiros por dia, o metrô sofreu uma "destruição brutal", afirmou declarou Grange.
As primeiras manifestações começaram de forma pacífica no dia 14 contra o aumento de preço do metrô de Santiago, que passaria do equivalente a US$ 1,12 para US$ 1,16. No sábado (19), o governo anunciou a suspensão do reajuste.
Desde sexta-feira (18), entretanto, os protestos se intensificaram e os chilenos expressam insatisfação com as políticas do governo Piñera, com o sistema previdenciário chileno, administrado por empresas privadas, o custo da saúde, o deficiente sistema público de educação e os baixos salários em relação ao custo de vida. As autoridades informaram que 716 pessoas foram detidas nas manifestações.
Cidade paralisada e desolada
Os supermercados e shoppings anunciaram que permaneceriam fechados neste domingo, para evitar saques. O metrô está paralisado e quase não circulam ônibus pela cidade.
Os táxis e os carros que são chamados por aplicativos para celulares — com tarifas muito acima do normal — eram praticamente a única forma de deslocamento na cidade de 7 milhões de habitantes, que passou por dois dias de violência extrema.
O presidente Sebastián Piñera se reunirá com os ministros neste domingo para abordar a situação. Protestos de tal magnitude eram inimagináveis há poucos dias, quando o próprio presidente afirmou que Chile era um "oásis" de tranquilidade na região.
A Câmara dos Deputados também convocou uma sessão especial para domingo. Universidades e escolas suspenderam as aulas na segunda-feira (19), mas os estudantes convocaram um novo dia de protestos.