Paraguai e Brasil decidiram anular um ato bilateral para a distribuição de energia hidrelétrica de Itaipu, assinado em maio passado, e que desencadeou uma crise política para o governo do presidente Mario Abdo.
O documento "será devolvido às instâncias técnicas para a negociação da contratação de energia elétrica da Itaipu Binacional", afirma um comunicado oficial divulgado nesta quinta-feira.
O pedido para cancelar o ato bilateral veio do governo de Abdo, após a rejeição que provocou no Paraguai e que levou a oposição a anunciar que iria exigir seu impeachment.
Após essa anulação, o pedido que devia ser feito ante o congresso perdeu força.
"Nós nos recuamos da intenção de iniciar o julgamento político contra o presidente da República. Acreditamos que com o documento que deixa a ata bilateral sem efeito, o dano está reparado", anunciou o deputado governista dissidente Pedro Alliana em sua conta no Twitter.
Sem os dissidentes do governista Partido Colorado, a oposição não conta com os votos necessários para destituir o presidente.
Depois de 24 horas sem aparecer em público, Abdo emitiu uma mensagem à nação, agradecendo aos que o apoiaram na crise, incluindo o presidente brasileiro Jair Bolsonaro.
"A democracia triunfou", disse ele.
- Preço de mercado -
As autoridades de ambos os países ordenaram que as instâncias técnicas retomassem as reuniões para definir o cronograma de energia contratado pela empresa brasileira Electrobras e a paraguaia Ande para a distribuição da energia elétrica da usina hidrelétrica binacional de Itaipu aos dois países no período de 2019- 2022.
Segundo alguns especialistas, o acordo teria causado uma perda de mais de 200 milhões de dólares para o Paraguai.
"O Paraguai deixou de receber US$ 75 bilhões por não vender sua parte de energia ao Brasil a preço de mercado, desde que a usina começou a operar em 1984", disse o cientista político Miguel Carter à AFP, segundo um cálculo baseado em números oficiais.
A hidrelétrica de Itaipu, erguida sobre o caudaloso rio fronteiriço do Paraná, é considerada a segunda maior do mundo depois da de Três Gargantas da China.
Possui uma capacidade instalada de 14.000 megawatts e abastece os estados mais ricos do Brasil, como São Paulo, Rio de Janeiro, Paraná e Rio Grande do Sul, entre outros.
O Paraguai utiliza apenas 7% da energia produzida e vende todo o seu excedente para a Eletrobras.
Os paraguaios acreditam que o Brasil paga um preço ridículo pela energia que compra do sócio e vizinho.
"Exigimos pagamento a preço de mercado", disse Ricardo Canese, especialista em hidrelétricas e parlamentar da Frente Guasú (Frente Ampla).
"Esta questão é tão sensível para os paraguaios que deveria ter sido tratada diretamente entre Abdo e Bolsonaro", destacou, por sua vez, o analista brasileiro Hiram Pessoa de Melo, especialista em campanhas políticas.
Mais cedo, em um comunicado, o Itamaraty afirmou que o Brasil expressava seu apoio ao presidente Abdo ante sua ameaça de impeachment, destacando "convergência de valores" entre os governos paraguaio e brasileiro.
"O desenvolvimento do Paraguai e sua participação ativa como valioso membro do Mercosul e da comunidade hemisférica é de enorme interesse para o Brasil", afirmou ainda o texto.
Bolsonaro chegou a declarar que estava aberto a discutir com o Paraguai.
"Lá vocês sabem como funciona, né? Lá é muito rápido o impeachment", afirmou.
Otávio Rêgo Barros, porta-voz de Bolsonaro, confirmou em outro comunicado que "o Brasil está aberto para discutir os termos do acordo que busca o benefício dos dois países".
* AFP