Há cinco dias a Califórnia acorda com cheiro de fumaça. Já são mais de 120 horas de chamas incessantes, dezenas de vítimas e milhares de hectares e casas destruídas no Estado mais populoso dos Estados Unidos, em um incêndio florestal que ganha contornos históricos. Em Calabasas, na região sul do Estado, uma densa nuvem cobre a cidade onde mora Viviane Schuch, 44 anos, natural de Porto Alegre, que teve de deixar sua casa acompanhada da família.
— Fomos orientados a pegar somente os documentos e sair de imediato — conta Viviane, que vive há seis meses no país com o marido Frederico Schuch, 45 anos, e a filha Ana Luiza, 18. — As pessoas não imaginavam que ia acontecer assim. Essa é a sensação — completa.
Mais de 250 mil pessoas foram evacuadas na região de Calabasas. Ela está no foco do Woolsey Fire — nome dado à propagação do incêndio que atinge a margem sul do Estado —, junto de Malibu e Hidden Hills. Simultaneamente, no norte, o Camp Fire afeta uma ampla região do condado de Butte, em Sierra Nevada, Sacramento e Paradise, este último já completamente devastado. Até agora, 44 mortes foram contabilizadas, o que torna o registro o mais letal da Califórnia desde o começo dos anos 90. Além disso, mais de 220 pessoas estão desaparecidas.
A orientação da polícia, segundo Viviane, foi de evacuação voluntária na quinta-feira (8), quando começou o incêndio. Em questão de uma hora, após "entrarem em contato com o síndico do condomínio, os bombeiros passaram pela rua avisando com um alto-falante que a evacuação era obrigatória".
— Estava muito perto, então foi rápido. Como havia muito vento, o fogo se espalhou de uma hora pra outra — explica.
Segundo levantamento feito pelo o jornal americano The New York Times, o principal fator é o clima. O Estado recebe umidade no outono e no inverno. Logo, a vegetação passa o verão secando lentamente por conta da falta de chuvas e temperaturas mais quentes. Com esse cenário, basta algo — como um raio — ou alguém para engatilhar um incêndio.
A facilidade encontrada na proliferação das chamas, avivadas por fortes ventos — chamados de Santa Anna winds —, é oposta à dificuldade encontrada no combate. Apenas 25% do incêndio foi contido nos mais de 70 mil hectares atingidos, somando norte e sul do Estado. A previsão dos bombeiros é de que o fogo possa ser contido em três semanas.
— Estamos cada dia em um hotel diferente. Estão todos lotados. Como não sabemos quando voltar, olhamos as notícias e esperamos, daí vemos que não vai dar, então procuramos um lugar para ficar. Não podemos voltar até que levantem a evacuação obrigatória, porque ainda tem vento.
Na tarde de segunda-feira (12), a família foi conferir a residência. Na rua de trás de onde moram, já haviam visto sete casas completamente destruídas. O contraste de ver casa inteira em frente à vista que antes era tomada por copa de árvores aliviou, com certa tristeza, a situação:
— Nós tivemos muita, muita sorte.
Relembre os incêndios florestais mais letais dos EUA desde os anos 1990
2018
10 mortos em dois incêndios
O incêndio Carr, que começou em 23 de julho, a oeste da cidade de Redding, no extremo norte da Califórnia, matou oito pessoas, incluindo três bombeiros. O fogo durou cerca de seis semanas. Segundo as autoridades, o incidente foi causado pela "falha mecânica de um veículo", que gerou faíscas em uma área ressecada. Mais ao sul, o maior incêndio registrado na Califórnia, o "Mendocino Complex", queimou cerca de 190 mil hectares em 27 de julho, causando a morte de duas pessoas.
2017
42 mortos em 20 incêndios
Entre 8 e 16 de outubro de 2017, 42 pessoas morreram em 20 incêndios que arrasaram o coração do norte da Califórnia. Cerca de 10 mil edificações foram reduzidas a cinzas e 100 mil hectares arrasados. O Tubbs Fire, que se estendeu ao longo dos condados de Napa e Sonoma, regiões vinícolas muito turísticas, foi um dos incêndios mais fatais. O fogo avançou particularmente rápido, intensificado por fortes ventos.
2016
13 mortos
De 28 de novembro a 2 de dezembro de 2016, houve um incêndio no turístico Parque Nacional de Great Smoky Mountains, perto da fronteira entre Tennessee e Carolina do Norte. As chamas se propagaram rapidamente pelos fortes ventos e deixaram 13 mortos.
2013
19 bombeiros mortos
Em 30 de junho de 2013, 19 bombeiros morreram em um gigantesco incêndio no Arizona (sudoeste) enquanto cavavam uma faixa para conter o fogo a cerca de 120 km a nordeste de Yarnell Hill, para impedir a expansão das chamas. Este foi o pior balanço de bombeiros mortos nos Estados Unidos desde os ataques de 11 de setembro.
2003
22 mortos
Intensos incêndios devastaram o sul da Califórnia durante duas semanas entre o final de outubro e o começo de novembro de 2003, deixando um saldo de 22 mortos, a maioria em San Diego e San Bernardino, e dois deles do lado mexicano da fronteira. Mais de 300 mil hectares foram destruídos pelos 17 incêndios e os custos superaram os 2 bilhões de dólares.
2000
13 mortos
Em julho e agosto de 2000, 13 pessoas morreram em dezenas de incêndios nos estados de Califórnia, Idaho, Nevada, Montana, Wyoming e Flórida. No total, 560 mil hectares foram destruídos, com perdas de até US$ 1 bilhão.
1994
20 bombeiros mortos
De 6 de julho a 9 de agosto de 1994, 20 bombeiros morreram no oeste do país em um incêndio que arrasou um milhão de hectares na Califórnia, Montana, Idaho, Oregon, Utah, Nevada e no estado de Washington. O pior balanço foi registrado em 6 de julho em Glenwood Springs, Colorado, onde as chamas mataram 14 bombeiros.
1991
25 mortos
Entre 20 e 22 de outubro de 1991, 25 pessoas morreram em um incêndio que se desatou em colinas sobre a cidade de Oakland, Califórnia, causando estragos em quase 3 mil edificações.