Pela primeira vez em 50 anos, a agência de migrações da ONU não será dirigida por um americano. Ken Isaacs, designado por Trump para a vaga, foi desbancado nas votações dos 172 membros pelo candidato português António Vitorino.
O posto de diretor da Organização Internacional para as Migrações (OIM) só não foi ocupado por americanos uma vez na história. Entre 1961 e 1969, o posto foi ocupado pelo holandês Bastiaan Haveman.
Desta vez, o candidato designado por Washington, Ken Isaacs, não reuniu os votos necessários, sendo o primeiro eliminado. Acusado de ser antimuçulmano e de não acreditar nas mudanças climáticas, Isaacs assegurou que "nunca" levava em conta a religião das pessoas necessitadas.
A nomeação do novo diretor-geral da OIM acontece em um momento em que o governo Trump tem recebido várias críticas da ONU em relação à proibição da entrada em seu território de cidadãos de seis países majoritariamente muçulmanos, além da sua recente decisão de separar crianças de seus pais migrantes, iniciativa que teve que abandonar pela forte pressão social nos Estados Unidos.
Os membros da organização elegeram o ex-ministro português Antonio Vitorino, de 61 anos, após cinco horas de votação. A candidata costa-riquense Laura Thomson, atual diretora-adjunta da OIM, decidiu retirar seu nome após a quarta rodada de votação. O novo diretor da OIM, que conta com 172 Estados-membros, assumirá suas funções em 1 de outubro. Ele sucederá o americano William Lacy Swing, que cumpriu os dois mandatos de cinco anos.
Amigo próximo de Guterres
Vitorino "teve uma brilhante carreira em Portugal como advogado e na política", apontou a OIM em um comunicado.
Político e advogado, Vitorino entrou no Partido Socialista português durante a Revolução dos Cravos de 1974, quando ainda não tinha 18 anos. Eleito deputado pela primeira vez em 1980 foi secretário de Estado durante o governo de Mario Soares (1983-1985) e ministro durante o de António Guterres (1995-1997).
Vitorino afirmou nesta sexta-feira que é um "amigo próximo" do secretário-geral da ONU. Segundo Guterres, ele é "um homem de bom conselho" e "o melhor de nossa geração".
Foi eleito ao Parlamento Europeu em 1994, embora seja mais lembrado como Comissário Europeu na pasta de Justiça e Assuntos Interiores entre 1999 e 2004. Em 1997, se demitiu como ministro da Defesa de Portugal depois que um jornal o acusou de sonegação de impostos.
Foi citado algumas vezes como candidato ao cargo de primeiro-ministro ou de presidente da República, mas desde essa época já não participa na vida política nacional.
Considerado um homem muito inteligente e pouco inclinado a um enfrentamento direto, Vitorino nunca se afastou totalmente das esferas do poder. Desde que deixou a política em 2005, Vitorino trabalhou como associado no escritório Cuatrecasas, Gonçalves Pereira & Associados, segundo a OIM.
Represália dos EUA?
A vitória do português é uma derrota para os Estados Unidos, e alguns se perguntam se Trump reduzirá, como represália, algumas linhas de crédito à organização.
Designado candidato em fevereiro, Isaacs esteve no olho do furacão desde que o jornal Washington Post publicou uma série de comentários antimuçulmanos que divulgou entre 2015 e 2017 nas redes sociais.
Em vários tuítes, que apagou após a polêmica suscitada, Isaacs afirmava, entre outras coisas, que o Corão "ordena" cometer atos violentos aos muçulmanos e sugeria que os refugiados cristãos deveriam ser prioritários em relação aos demais.
Isaacs lamentou seus comentários "imprudentes", e o Departamento de Estado considerou "apropriado" que se desculpasse por suas palavras.