O fundador e CEO do Facebook, Mark Zuckerberg, afirmou que a empresa "cometeu erros" que levaram milhões de usuários da rede a ter seus dados explorados pela consultoria política, Cambridge Analytica. Ele também garantiu estar disposto à colaborar como for preciso e evitar que dados sejam novamente explorados indevidamente para influenciar campanhas eleitorais em outros países.
— Nós temos a responsabilidade de proteger seus dados (dos usuários), se não pudermos, não merecemos atendê-los — declarou.
A consultoria é acusada de ter usado dados de cerca de 50 milhões de usuários do Facebook e ter influenciado eleições de maneira indevida. A companhia obteve as informações em 2014 e utilizou os dados para desenvolver uma aplicação que "previa e influenciava decisões dos eleitores", segundo reportagens publicadas pelo jornal The New York Times e pelo Canal britânico 4. Segundo as reportagens, a consultoria também poderia agir em eleições na Índia e este ano no Brasil.
Em entrevista, na noite dessa quarta-feira (21), à rede de tv norte-americana CNN, Zuckerberg afirmou estar disposto até mesmo a ir ao Congresso brasileiro se for chamado para testemunhar e ajudar.
Ele admitiu ter ocorrido o que chamou de "quebra de confiança". Mais cedo, já havia publicado um pedido de desculpas em sua página oficial na rede social. Durante a entrevista à rede CNN, Zuckerberg afirmou estar profundamente triste e reafirmou que vai adotar as ações necessárias para proteger os dados de usuários e "dificultar" a coleta de dados de informações por "aplicativos desonestos".
Zuckerberg afirmou ainda que a empresa vai aprender com a experiência para proteger ainda mais sua plataforma e tornar a comunidade mais segura para todos. O Facebook investiga o vazamento dos dados que supostamente teriam sido usados pela empresa de consultoria britânica Cambridge Analytica, contratada pela campanha presidencial de Donald Trump em 2016. Agora se discute como redes sociais, entre elas o Facebook, podem ter sido usadas na veiculação de notícias falsas no jogo político internacional e nacional.
O Facebook soube das ações de Kogan e da Cambridge Analytica em 2015. Na ocasião, a empresa baniu o pesquisador da rede social e exigiu garantias de que a Cambridge Analytica havia excluído os dados. Zuckerberg afirmou que só soube que a consultoria ainda mantinha os dados por meio das reportagens publicadas no último sábado. O executivo não esclareceu por que não informou os usuários sobre o problema em 2015.
Apesar de reconhecer que a forma como o Facebook foi construído foi o que permitiu que as empresas obtivessem os dados, Zuckerberg não pediu desculpas aos 2,13 bilhões de usuários do site. Em suma postagem em sua conta na rede social, ele destacou as ações que a empresa já havia tomado e para sinalizar o que vem pela frente.
Auditoria
Uma das primeiras medidas do Facebook a partir de agora será investigar desenvolvedores que acessaram um grande volume de dados pessoais antes das mudanças de 2014. Os aplicativos suspeitos passarão por auditorias.
— Vamos banir qualquer desenvolvedor que não concorde — disse.
Segundo Zuckerberg, o Facebook fez mudanças em 2014 para garantir que aplicativos de terceiros não tivessem mais acesso a dados de amigos de quem aceitou se conectar a um quiz como o de Kogan. Isso limita a quantidade de dados compartilhados: no caso de Kogan, 300 mil pessoas usaram o serviço, mas por meio deles o desenvolvedor conseguiu dados de 50 milhões de usuários.
Agora, os desenvolvedores só terão acesso a nome, foto de perfil e endereço de e-mail dos usuários — hoje, são compartilhados todos os dados do perfil público, a lista de amigos e o e-mail. O executivo diz que vai revogar o acesso dos apps, caso não sejam utilizados por três meses, e facilitar o acesso à ferramenta que permite bloqueá-los.
Fogo
Para especialistas, as medidas mostram que o Facebook está tentando controlar o "incêndio" dos últimos dias.
— Não é nem de longe suficiente, mas eles estão tentando impedir que usuários deletem a rede social, o que poderia significar uma perda massiva de receita — diz Rafael Zanatta, pesquisador do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
Para Carlos Affonso de Souza, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS-Rio), as medidas não resolvem o problema totalmente:
— Não sabemos quantos outros apps podem ter descumprido as regras do Facebook.
Para Zanatta, a proposta de autorregulação da empresa não será aceita pelos governos:
— É impossível que os reguladores se contentem com isso. Eles devem colocar agentes públicos e peritos na empresa para investigar o que aconteceu.
Segundo Bruno Bioni, pesquisador da Rede Latino-Americana de Estudos em Vigilância, Tecnologia e Sociedade (Lavits), a solução é mais complexa:
— O problema do Facebook está em seu modelo de negócios, baseado no uso de dados e no impulsionamento de produtos e, agora, de políticos. Precisamos nos perguntar se isso é saudável para a democracia.