O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, confirmou nesta quinta-feira (8) a decisão de sobretaxar em 25% as importações de aço e em 10% as de alumínio. A medida começa a valer em 15 dias.
Apesar de a China ser nos discursos o principal alvo, o Brasil é o mais atingido. O país é o segundo maior exportador de aço para o mercado americano, atrás apenas do Canadá, que, ao lado do México, ficou por enquanto isento, em razão da renegociação do Acordo de Livre Comércio da América do Norte.
Trump citou a competição “injusta” da China, mas disse que outros os países poderão solicitar por isenções, que serão avaliadas caso a caso.
A crise aberta pelo presidente americano, colocando em prática seu discurso protecionista, promessa de campanha, leva ao temor de desencadeamento de guerra comercial, com reflexos na economia global. União Europeia e China, por exemplo, afirmaram que vão retaliar.
O presidente executivo do Instituto Aço Brasil (IABr), Marco Polo de Mello Lopes, disse ser necessário entrar imediatamente com recurso contra a decisão.
De outro lado, afirma que o governo brasileiro precisará avaliar a necessidade de proteção do mercado brasileiro, visto que o fluxo de aço que deixará de ser direcionado aos Estados Unidos poderá recair no Brasil.
— Esperamos que o Ministério da Fazenda tenha sensibilidade de que há uma guerra comercial detonada pelo Trump de proporções grandes — alertou Mello Lopes.
Estudiosa do tema, a pesquisadora Lia Valls, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV), lembra que a proteção à siderurgia é tema recorrente nos EUA.
Nos episódios anteriores, houve recuo à medida que as iniciativas eram questionadas na Organização Mundial do Comércio (OMC). O grande temor seria Trump afrontar a OMC.
— Aí seria um cenário de ruptura — alerta Lia.
Negócio movimentou US$ 3 bilhões em aço
Apesar da retórica contra a China, o gigante asiático foi responsável por apenas 2,2% das importações americanas no ano passado. É somente o 11º na escala de importância.
O Brasil teve fatia de 13% em 2017. Também chama a atenção o fato de que os produtos embarcados pelo Brasil, semiacabados, são mais matéria-prima da cadeia siderúrgica americana do que concorrentes.
— A economia americana é muito interconectada e isso vai acabar prejudicando outros setores importantes, como a indústria automobilística, que também tem lobby poderoso — ressalta Lia.
O IABr lembra que 80% da exportação é de semiacabados.
Os Estados Unidos são o maior destino das vendas externas brasileiras. No ano passado, absorveram 32,7% do produto embarcado pelo Brasil.
É um negócio que, em 2017, movimentou quase US$ 3 bilhões apenas em aço. A entidade estima que os EUA deixarão de importar cerca de 20 milhões de toneladas, volume que deverá ser direcionado para outros países, como o Brasil, afetando os preços no mercado interno.
Apesar da tensão, o coordenador do Conselho de Relações Internacionais e Comércio Exterior (Concex) da Federação das Indústrias do Estado (Fiergs), Cezar Muller, diz não acreditar em um conflito comercial generalizado.
— Por nossa experiência, assuntos dessa natureza, em um primeiro momento, são colocados de forma mais ríspida, mas depois as partes chegam a um bom termo de forma negociada — avalia.
Após os EUA terem assinado medida que sobretaxa as importações de aço e alumínio, com reflexo na siderurgia brasileira, os setores da indústria gaúcha que mais exportam para a maior economia do mundo começam a monitorar mais de perto possíveis novas iniciativas que possam afetar os negócios.
O país é o terceiro principal destino das vendas externas do Estado, superado apenas por China e Argentina. No ano passado, os gaúchos comercializaram US$ 1,29 bilhão para a nação comandada por Donald Trump.
Embora as exportações de aço produzido no Estado para os EUA sejam insignificantes, o volume é considerável em segmentos como tabaco, armas, petroquímicos e calçados.
Apesar da atenção e do temor dos reflexos indiretos que uma guerra comercial entre americanos e outros países poderia ter na economia global (com possibilidade de respingar no Estado, pela vocação exportadora), por enquanto parece não haver perigo iminente. O que não significa certeza de inexistência de riscos.
— Não vemos nenhum sinal pela frente, mas seis meses atrás não pensávamos que isso poderia acontecer com o aço — pondera o presidente-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein.
O dirigente observa que os EUA absorvem cerca de 20% das exportações brasileiras de calçados, lideradas pelo Rio Grande do Sul. Klein pondera que é muito pequeno o número de fábricas de calçados nos Estados Unidos e que não concorrem com o produto brasileiro.
Não há, ressalta, nenhum indicativo de que os EUA queiram reativar este tipo de indústria, o que dá certo alívio para o setor.
O fumo é o principal item exportado pelo Rio Grande do Sul para os Estados Unidos. O setor torce para não ser vítima dos arroubos protecionistas de Trump:
— Esperamos que o setor do tabaco não seja afetado por medidas restritivas, até porque os EUA são um importante importador do produto brasileiro — diz o presidente do Sindicato Interestadual da Indústria do Tabaco (SindiTabaco), Iro Schünke.
Para a indústria petroquímica também parece não haver risco imediato, afirma José Luiz Zuñeda, diretor da consultoria Maxiquim. Ele lembra que os Estados Unidos, ao contrário da siderurgia, são muito competitivos no setor. Com isso, não há pressão interna por proteção.
Zuñeda observa ainda que os EUA importam petroquímicos de um número muito maior de países em comparação aos fornecedores de aço. Uma medida protecionista, acrescenta, tenderia a criar tensão comercial com um número bem superior de nações.
Outro setor que exporta para os EUA é o de máquinas e equipamentos. Até agora, parece não pairar nenhuma ameaça direta.
— Não temos nada no radar. Não somos foco. O Brasil é muito pequeno para os Estados Unidos — avalia Hernane Cauduro, vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq) no Estado.