Um grupo de militares ocupa ruas de Harare, capital do Zimbábue, nesta quarta-feira (15), após um comandante do Exército ameaçar intervir para acalmar a tensão em torno da sucessão do ditador Robert Mugabe, de 93 anos e há 37 no poder. Três ministros teriam sido detidos, informou o jornal local independente NewsDay.
A movimentação nos quartéis começou no final da noite de terça (14), quando comboios de veículos blindados começaram a se instalar nas entradas da cidade. Soldados revistavam pedestres com violência e carregavam suas armas nos postos.
Há bloqueio no acesso a edifícios do governo na capital, incluindo o Mwenemutapa, que abriga o escritório do presidente, o Parlamento e o Supremo Tribunal. Além disso, as informações apontam para uma forte presença militar na estrada que leva à residência rural de Mugabe, no distrito de Zvimba.
Pelo menos três explosões ocorreram na cidade e tiros foram ouvidos próximo à residência do ditador. Na sequência, o grupo controlou a ZBC, estatal de comunicação, e fez funcionários reféns antes de lerem um comunicado.
Ao vivo na TV pública, dois soldados não identificados afirmavam não se tratar de um golpe de Estado contra Mugabe, a quem chamam de "Sua Excelência", e disseram que o ditador e sua família "estão sãos e salvos".
Eles informaram o andamento de uma operação contra "criminosos" próximos ao presidente. Em mensagem à Nação em rede nacional de TV, após tiroteios na capital, os oficiais garantiram que "não se trata de uma tomada do governo por militares".
— Queremos assegurar à Nação que sua excelência, o presidente (...) e seus familiares estão sãos e salvos, com sua segurança garantida — declarou um general. — O alvo são criminosos em seu entorno (de Mugabe) que estão cometendo crimes. Após cumprirmos nossa missão esperamos que a situação volte à normalidade.
A declaração ocorre após um forte tiroteio durante a madrugada, na zona da residência de Mugabe em Harare.
Esta é a primeira vez que há um conflito de Mugabe, um dos líderes mais velhos e longevos do mundo, e os militares, seu pilar de sustentação. Na semana passada, o ditador expurgou seu vice, Emmerson Mnangagwa, e o acusou de planejar sua derrubada, inclusive com o uso de bruxaria. O político, tem fortes vínculos com o Exército, após ter ocupado o cargo de ministro da Defesa, era visto como um potencial mandatário, saiu do país e disse ter sido ameaçado.
Mais de cem funcionários de alto escalão do governo acusados de dar apoio a Mnangagwa, 75, foram punidos pela ala do regime ligada à mulher de Mugabe, Grace, 52, agora uma das mais cotadas para substituir o rival do ditador a partir de dezembro.
A primeira-dama é impopular por seus gastos vultuosos, enquanto a maioria da população passa por dificuldades. Recentemente, quatro pessoas foram presas pelas forças do regime acusadas de vaiá-la em um comício.
Mugabe, que dirige o Zimbábue com mão de ferro desde a independência do país, em 1980, já anunciou que concorrerá em 2018 a um novo mandato.
Sob o seu regime autoritário, o país africano empobreceu muito e desde o início dos anos 2000 lida com um desemprego em massa — cerca de 90% da população ativa — e uma falta de liquidez que atrasa o pagamento dos salários dos funcionários.
Reação ao expurgo
Na segunda, o comandante do Exército, Constantino Chiwenga, 61, disse que os expurgos deveriam parar imediatamente.
— Nós devemos lembrar àqueles ligados aos atuais traidores que, quando tivermos que proteger nossa revolução, não vamos hesitar em intervir.
A declaração foi criticada pela juventude do regime, aliada de Grace, nesta terça. À noite, o partido de Mugabe disse que a nota do militar foi "claramente calculada para prejudicar a paz nacional e incitar à insurreição".
A pressão social sobre o ditador cresceu nos últimos anos com a crise econômica. No ano passado, o Zimbábue passou pela maior onda de protestos contra Robert Mugabe em uma década e alguns de seus principais aliados tiraram seu apoio ao regime.