Recentemente, a Liga Antidifamação adicionou um novo símbolo ao Hate on Display (Exibição de Ódio, em tradução livre), seu banco de dados de imagens usadas pela supremacia branca. Ele foi denominado "eco" e usado on-line para chamar atenção para nomes judaicos nas notícias.
O símbolo nasceu em 2014 de um podcast antissemita, "The Daily Shoah", que aplica aos nomes judaicos um efeito sonoro original, que os faz ecoar ameaçadoramente.
A prática então se espalhou para os blogs e o Twitter, onde os criadores dos podcasts e seus fãs inventaram uma tradução visual do efeito sonoro de eco colocando três pares de parênteses em volta de um nome judaico, como (((Cohen))) ou (((Goldberg))). Os parênteses apareceram em uma extensão do navegador Chrome chamada "Detector de Coincidência", que descobria nomes judaicos em textos e automaticamente os prendia nos ecos. (Desde então o Google baniu a extensão da loja do Chrome.) Empreendedores nacionalistas brancos agora estão imprimindo o eco em camisetas.
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É assim que um símbolo de ódio nasce em 2016: um efeito em um podcast se torna um meme no Twitter e uma extensão de navegador antes de finalmente entrar no mundo físico.
O "eco" é o primeiro símbolo reconhecido oficialmente que emergiu do "alt-right", um movimento de extremistas do orgulho branco que são tão obcecados com memes culturais quando com o nacionalismo branco. Eles usam a iconografia da supremacia branca de maneira irresponsável, misturando-a com a cultura pop e com o tom sarcástico da subcultura da internet. Sua mensagem antiquada, envolta em um apelo ultramoderno, está sendo espalhada para uma nova geração de guerreiros que se preocupam com a raça das pessoas.
"Hoje temos um número ilimitado de memes de supremacia branca, assim como há um número ilimitado de memes de gatos", diz Mark Pitcavage, especialista em extremismo de direita que também mantém o banco de dados da Liga Antidifamação. "Eles pegam todos os tipos de memes da cultura pop e os transformam em algo da supremacia branca".
Os memes da moderna supremacia branca usam recrutas impensáveis. Com a ajuda de edição digital de fotos, Guy Fieri se transformou em um soldado nazista, e Taylor Swift se tornou uma "deusa ariana". (Recentemente os advogados de Taylor Swift mandaram uma carta para um blog alt-right pedindo que parassem e desistissem de associar a imagem da cantora com a retórica antissemita.) O mais recente episódio do podcast "The Daily Shoah" (que é uma brincadeira com o programa "The Daily Show") começou com uma paródia antissemita da balada do Poison, ''Every Rose Has Its Thorn". Até mesmo um anúncio no Twitter para a pizza DiGiorno ("Você já se pegou apenas olhando para o forno?") pode ser transformado em uma referência ao holocausto, apenas por ser compartilhado por uma conta alt-right.
"Não deveria nos surpreender que os intolerantes sejam os primeiros a adotar a tecnologia", afirma Jonathan Greenblatt, executivo-chefe da Liga Antidifamação. "É difícil fazer circular seus pontos de vista nocivos abertamente". Mas nas redes sociais "eles podem publicar alguma coisa no Twitter ou no Facebook e conseguir um alcance exponencial sob o manto do anonimato".
Os intolerantes da velha guarda vêm reciclando imagens ofensivas há décadas. "O movimento de supremacia branca é muito orientado visual e simbolicamente. Quando um símbolo se estabelece, ele não tende a sumir", explica Pitcavage.
Ele vê racistas traduzirem códigos da Klan em endereços de e-mail e espalharem a insígnia nazista em fóruns de mensagens
desde 1980. "Assim que surge um novo elemento da internet, os supremacistas brancos se apoderam dele", afirma Pitcavage.
O símbolo do eco é emblemático de uma nova classe de intolerância nascida e criada on-line. No começo dos anos 2000, o slogan "Antirracista é o Código para Antibrancos", retirado do tratado pró-segregacionista chamado "O Mantra", proliferou on-line como uma peça de supremacia branca de "copiar e colar" – texto que é obsessivamente copiado e redistribuído pelos fóruns da internet. O sinal matemático para "não igual" foi reaproveitado como uma declaração contra a igualdade racial. Como o eco, ele aproveita o teclado do computador para criar um novo simbolismo supremacista para a era moderna.
A Liga Antidifamação chamou o alt-right de "a nova supremacia branca", com integrantes que zombam das demonstrações de orgulho branco de seus avós enquanto criam seus próprios. Os apresentadores do "The Daily Shoah" pronunciam de maneira performática a palavra "white" como "huh-white", uma paródia do estilo antiquado. O eco do podcast brinca com os efeitos sonoros ridículos usados pela velha guarda da direita em suas falas chocantes.
Muito da linguagem e do visual dos alt-rights foi tirado do 4chan, um fórum de mensagens efêmeras e anônimas que se deleita com piadas politicamente incorretas e postura niilista. As turvas discussões do 4chan "tendem a representar uma perspectiva libertária, branca e masculina", afirma Ryan Milner, professor de Comunicação da Faculdade de Charleston que estuda grupos on-line. "Seu humor brinca com estereótipos definitivos que se desviam para a supremacia branca".
Tanto o alt-right quando o 4chan compartilham seus insultos favoritos, como "cucks'(homem afeminado) e "normies" (as massas pouco sofisticadas) e trabalham com a mesma paleta de memes, distribuindo porcarias da cultura pop que perpetuam o racismo e o antissemitismo. Pepe the Frog, personagem favorito de desenho do 4chan que se tornou um ídolo de muitos adolescentes no Tumblr, surgiu como uma mascote não oficial do alt-right. É que nas contas dos alt-right, Pepe aparece com um nariz adunco exagerado ou adornado com uma peruca à la Trump.
Os alt-right pegam os discursos da subcultura disponível on-line e os levam ao nível da agitação política. O Centro de Legislação de Pobreza do Sul traçou o apoio fervoroso para Donald Trump entre os "extremistas de direita", que compartilham "memes exultantes celebrando a ascensão de Trump". Em abril, o centro relatou que uma parte da retórica de Trump pode "fazer com que mais gente preste atenção aos memes racistas".
Veja o que acontece entre os próprios blogueiros alt-right. O movimento está "ganhando a guerra dos memes", escreveu em maio um blogueiro alt-right que se autointitula Lawrence Murray.
As figuras públicas judaicas entraram na briga. No Twitter, escritores judeus se apropriaram do eco, adicionando parênteses em torno de seus nomes no Twitter em uma demonstração de desafio. Por sua vez, os nacionalistas brancos como Lana viraram o símbolo para mostrar sua origem não judaica: )))Lana(((.
Das profundezas da cultura on-line, novos discursos de ódio aparecem: a palavra "cuckservative", uma junção de "cuckold" (corno) e "conservative" (é uma longa história), foi agora reconhecida pelo Centro de Legislação de Pobreza do Sul como um insulto racista.
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