Nova York - De mudança para Nova York, o casal alemão Miriam e Christian Rengier visitou algumas escolas particulares de ensino básico em Manhattan na última primavera em busca de uma vaga para o filho. Imediatamente, perceberam a ausência de diversidade étnica e a presença de motoristas levando e buscando as crianças na porta. Em uma outra escola, então, a guia que os acompanhava mostrou a eles o refeitório.
- As crianças tinham sete opções diferentes de almoço: sushi, macrobiótico e tudo mais. Eu disse: "E se eu não quiser que meu filho tenha sete opções de almoço diferentes?". E a guia olhou para mim como se eu fosse uma idiota - lembrou Miriam Rengier.
Para os Rengier, a decisão ficou clara: o filho iria estudar em escola pública.
- Não era uma questão de podermos ou não pagar pelas instituições particulares. Mas sim uma questão de saber se nosso filho teria uma vida real ou não - disse Miriam Rengier, cujo marido foi transferido para a cidade por causa de seu trabalho como advogado e consultor fiscal.
Em Nova York, os ricos normalmente matriculam os filhos em escolas particulares. Em contrapartida, a grande maioria dos endinheirados nascidos no exterior que vivem na cidade têm optado por escolas públicas, de acordo com uma análise dos dados obtidos pelo censo.
Na cidade, há cerca de 15,5 mil domicílios com pais que nasceram no exterior e crianças em idade escolar que têm uma renda total de pelo menos US$ 150 mil anuais. Destes, cerca de 10,5 mil, ou 68%, usam apenas escolas públicas, mostram os dados. Isso é quase o dobro do índice apurado entre americanos da mesma faixa de renda na cidade.
Os dados do censo incluem tanto os imigrantes quanto aqueles que vivem temporariamente na cidade por motivo de trabalho. A disparidade é ainda mais acentuada entre os pais estrangeiros com renda familiar de pelo menos US$ 200 mil anuais. Cerca de 61% colocam seus filhos em escolas públicas, em comparação a 28% dos americanos que têm a mesma faixa de renda.
Como resultado, algumas escolas públicas de ensino básico situadas nas regiões mais ricas de Manhattan e do Brooklyn têm verificado um aumento inesperado nas matrículas de alunos estrangeiros, especialmente europeus ocidentais.
- Nós nunca tivemos números assim. Mas também nunca tivemos tantas famílias estrangeiras ricas morando na vizinhança - disse Elizabeth Phillips, que é diretora de uma escola do Brooklyn há 13 anos.
Existe uma divergência semelhante em outras grandes cidades, mostram os dados do censo. Por exemplo, em Los Angeles e Chicago, cerca de 60% dos casais nascidos no exterior que têm renda familiar anual de pelo menos US$ 150 mil matriculam os filhos apenas em escolas públicas, um índice muito maior do que o observado entre os pais americanos.
Nos Estados Unidos em geral, praticamente não há qualquer diferença entre os dois grupos, aparentemente porque a população abastada que vive fora das zonas urbanas está muito mais propensa a ser leal às escolas públicas.
Em termos nacionais, 73% dos americanos e 76% dos nascidos no exterior optam por colocar os filhos apenas em escolas públicas, de acordo com os dados, que foram analisados por Andrew A. Beveridge e Susan Weber-Stöger, demógrafos da Faculdade Queens. Aos serem entrevistados, os estrangeiros ricos afirmaram ter considerado vários critérios na escolha das escolas, incluindo qualidade, custo e localização.
Contudo, muitos disseram que também foram influenciados pela maior diversidade étnica e econômica das escolas públicas. Alguns disseram que como imigrantes, tinham aprendido a transitar entre culturas diferentes - uma habilidade que eles querem incutir nos filhos.
- Quando frequentam a escola pública, as crianças experimentam um novo mundo, um mundo inteiro de pessoas diferentes e valores diferentes, que corresponde ao mundo real. Protegê-los disso seria um desserviço - disse Lyn Bollen, que cresceu em Birmingham, Inglaterra, e estudou - assim como ensinou - em escolas públicas.
Ela e o marido, que trabalha para o Citigroup, mudaram-se para Manhattan com os filhos há dois anos. Atualmente, seu filho mais velho estuda na escola pública localizada perto de sua casa, em Battery Park City. Mamta Prakash-Dutta, gerente financeira de uma organização sem fins lucrativos para jovens sul-asiáticos, e seu marido, executivo da Autoridade de Transporte Metropolitano, vêm da Índia.
Para Mamta Prakash-Dutta, o modo como foram educados ensinou a eles como se desenvolver em um mundo globalizado.
- Estamos sempre para lá e para cá, mas nossos filhos provavelmente vão passar por muitos outros países. Por isso, é importante que eles sejam capazes de lidar com o multiculturalismo. É possível adquirir desenvoltura e jogo de cintura nas escolas públicas - disse ela.
O casal escolheu uma escola pública localizada perto de sua casa em Manhattan. Claro, os nova-iorquinos endinheirados nascidos no exterior tendem a residir em bairros relativamente prósperos, que costumam ter escolas públicas melhores.
Ainda assim, alguns afirmaram que por terem crescido em países com sistemas públicos de ensino de qualidade, chegaram a Nova York com a cabeça mais aberta quanto à educação pública. Os imigrantes do Canadá e vários países da Europa Ocidental afirmaram que as escolas particulares de seus países muitas vezes eram vistas como lugares para crianças que possuem necessidades educativas especiais.
A maioria das famílias abastadas que conheciam matriculava os filhos em escolas públicas, contaram eles.
- Cresci na Dinamarca, uma sociedade em que tudo é público, tudo é financiado pelo Estado. Eu mesmo estudei em escolas públicas. Para mim, funcionou muito bem, então eu já pensava que a escola pública pode ser uma coisa boa - disse Morten Degnemark, que chegou aos Estados Unidos em 2004 e dirige uma empresa de diamantes e joias em Manhattan.
Para algumas famílias recém-chegadas, a escola pública tem servido a um propósito prático. Em 2009, Gilles Bransbourg se mudou com a família da França para Nova York, sem saber quanto tempo ficaria na cidade. Ele procurou um programa anglo-francês para os filhos, tentando oferecer a eles uma transição mais suave para o mundo anglófono e ajudá-los a continuar falando sua língua nativa.
- Os estrangeiros nem sempre ficam aqui por muito tempo. Eles têm outras preocupações que os americanos não têm - disse Bransbourg, ex-banqueiro de investimentos que hoje é pesquisador associado do Instituto de Estudos do Mundo Antigo, na Universidade de Nova York.
Ele e a esposa consideraram o Lycée Français de Nova York, que fica em Manhattan e é particular, mas também se interessaram pelos programas bilíngues do sistema público. O casal optou por uma escola pública do Brooklyn que oferece um currículo anglo-francês e possui uma boa reputação, atraído ainda pela oportunidade de aprofundar o envolvimento com a vizinhança.
- Achamos ótimo porque os nossos filhos poderiam fazer parte de uma comunidade americana. É importante fazer parte da comunidade onde você vive e não ficar afastado desse ambiente - disse Bransbourg.
Bransbourg, que tem um bebê e duas crianças na escola primária, disse que também ficou aliviado por não ter de pagar a anuidade de US$ 26,1 mil cobrada pelo Lycée. As anuidades das escolas particulares de Nova York aumentaram consideravelmente na última década. As escolas de ensino básico, em particular, chegam a custar US$ 40 mil por ano.
Vários pais estrangeiros disseram ter achado esses valores surpreendentes. A advogada Ashima Dayal, que chegou da Índia quando era criança, disse que seus pais a educaram com a tenacidade e a desenvoltura características dos imigrantes. Segundo ela, essa experiência provavelmente fez com que ela se tornasse menos exigente a respeito de certas comodidades e tolerasse mais algumas das deficiências do sistema público.
- Meus amigos americanos costumam dizer coisas como "O refeitório não é bom". Eu não dou a mínima se o refeitório é bom ou não. O que não quero é ver estilhaços no ginásio - contou Dayal.
Ela fez uma pausa, acrescentando:
- Eu simplesmente sou de um lugar diferente.